Manchetes Socioambientais
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“O encontro entre índios e brancos só se pode fazer nos termos de uma necessária aliança entre parceiros igualmente diferentes, de modo a podermos, juntos, deslocar o desequilíbrio perpétuo do mundo um pouco mais para frente, adiando assim o seu fim.”
Eduardo Viveiros de Castro, antropólogo, um dos fundadores do ISA
O tema "Povos Indígenas" está na origem da existência do Instituto Socioambiental. Lá se vão pelo menos quatro décadas de comprometimento e trabalho com o tema, produzindo informações para a sociedade brasileira conhecer melhor seus povos originários. Desde sua fundação, em 1994, o ISA dá continuidade ao trabalho do Centro Ecumênico de Documentação e Informação (Cedi), que havia sido iniciado em 1980 e que, por sua vez, remonta ao começo dos anos 1970, quando o então governo da ditadura militar lançava o Plano de Integração Nacional, com forte componente de obras de infraestrutura na Amazônia, região que era então descrita pelo discurso oficial como um "vazio demográfico".
Por meio dos relatos coletados, dados produzidos e pesquisas empreendidas por uma rede de colaboradores espalhada pelas diversas regiões do País, o Cedi ajudou a derrubar essa tese. Ao dar publicidade às informações levantadas por essa rede social do tempo do telex, o Cedi colocou, definitivamente, os povos indígenas e suas terras no mapa do Brasil. Seus integrantes ainda participaram ativamente no movimento de inclusão dos direitos indígenas na Constituição de 1988 e, juntamente com integrantes do Núcleo de Direitos Indígenas (NDI) e ativistas ambientais, fundaram o ISA em 1994.
De lá para cá, ampliando sua rede de colaboradores em todo o País, o ISA se consolidou como referência nacional e internacional na produção, análise e difusão de informações qualificadas sobre os povos indígenas no Brasil. O site "Povos Indígenas no Brasil", lançado em 1997, é a maior enciclopédia publicada sobre as etnias indígenas no Brasil, com suas línguas, modos de vida, expressões artísticas etc. O site é uma das principais referências sobre o tema para pesquisadores, jornalistas, estudantes e acadêmicos.
A atuação hoje é transversal aos territórios onde atuamos, especialmente na Bacia do Xingu, no Mato Grosso e Pará, e Bacia do Rio Negro, no Amazonas e Roraima, e também envolve povos indígenas de todo o Brasil, por meio da atualização permanente do site e de seus mais de 200 verbetes, inclusão de novos textos sobre etnias emergentes e indígenas recém-contatados, além do monitoramento e cobertura jornalística sobre situações de violência e perda de direitos contra estas populações. O tema "Povos Indígenas" ainda é tratado no site "PIB Mirim", voltado ao público infanto juvenil e de educadores.
O monitoramento de Terras Indígenas também é um eixo central do nosso trabalho com o tema, e remonta à sistematização de dados e divulgação de informações iniciada pelo Cedi em 1986, e se dá por meio da produção de livros impressos e mapas temáticos sobre pressões e ameaças, como desmatamento, mineração, garimpo, obras de infraestrutura, entre outras, além do site "Terras Indígenas no Brasil".
Confira os conteúdos produzidos sobre este tema:
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Em formato de enciclopédia, é considerado a principal referência sobre o tema no país e no mundo |
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A mais completa fonte de informações sobre o tema no país |
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Site especial voltado ao público infanto-juvenil e de educadores |
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Painel de indicadores de consolidação territorial para as Terras Indígenas |
Documento foi elaborado durante o XVI Encontro de Mulheres Yanomami com assinatura de 67 lideranças femininas da maior Terra Indígena do Brasil
Sessenta e sete mulheres Yanomami assinaram uma carta se posicionando contra a mineração em Terras Indígenas e pedindo para que autoridades não indígenas “parem de mexer com essa palavra sobre mineração”. O documento, divulgado nesta terça-feira (21/10), foi elaborado durante o XVI Encontro de Mulheres Yanomami, na comunidade Kawani, no Rio Mapulaú, afluente do Rio Demini, no Amazonas, que ocorreu entre 22 e 26 de setembro e contou com participantes de 40 comunidades de sete regiões da Terra Indígena Yanomami.
“Nós, mulheres Yanomami, queremos dizer para vocês, autoridades não indígenas, que parem de falar sempre sobre aquilo que vocês chamam de mineração, que parem de mexer com essas palavras sobre “mineração em Terras Indígenas”, pois não vamos deixar que vocês se aproximem de nossas terras, não aceitamos a mineração na floresta onde vivemos e queremos que vocês desistam disso”, diz trecho do documento.
A carta também conta com reflexões sobre a saúde das mulheres Yanomami, especialmente no que diz respeito à prevenção do câncer do colo de útero, e sobre a necessidade de assistência social aos indígenas quando precisarem se deslocar à cidade. Os tópicos também foram discutidos durante o XVI Encontro de Mulheres.
Durante o evento, as mulheres assistiram a filmes que explicam o que é mineração e os impactos que pode causar. A partir dos filmes, foram feitas reflexões sobre os estragos que o garimpo ilegal causou nos últimos anos no território Yanomami. A partir dos filmes e das discussões feitas, as participantes do encontro afirmam categoricamente que não desejam ver grandes maquinários adentrarem a floresta para causar destruição.
“Vimos imagens de mineração durante nosso encontro e algumas de nós não dormiram. Ficamos muito preocupadas: ‘Hoo... por que os napëpë querem fazer esta coisa assustadora com a floresta? Por que fazem isto?’ E pensamos em nossos filhos com preocupação: ‘como eles irão ficar? Se a mineração chegar aqui, o que vai acontecer conosco? Onde nossos filhos irão poder dormir bem? Por que as pessoas procuram minérios em nossa terra?’”, aponta trecho da carta.
Em agosto deste ano, a Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado aprovou o PL 1.331/2022, que autoriza pesquisa e garimpo em Terras Indígenas. O texto, proposto pelo senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR) e aprovado com a relatoria de Damares Alves (Republicanos-DF), seguiu para a Comissão de Meio Ambiente e aguarda a escolha de um relator.
“Não aceitamos mineração na Terra Indígena Yanomami, pois não queremos que façam sofrer nossos filhos. Nós, mulheres Yanomami, não queremos que o projeto de mineração seja aprovado”, dizem as mulheres Yanomami.
Ainda conforme a carta, as Yanomami temem que garimpeiros cometam violência sexual contra suas filhas, se preocupam com a contaminação dos rios, peixes, o impacto na caça e a destruição da floresta. Elas pedem que as autoridades e governantes não indígenas levem as palavras delas a sério.
Saúde das mulheres Yanomami
Durante as conversas sobre saúde, as Yanomami reivindicaram a ampliação do projeto Construção da Linha de Cuidado do Câncer do Colo de Útero (CCU) na Terra Indígena Yanomami, que visa a construção de uma cadeia de prevenção e diagnóstico precoce das lesões precursoras para evitar casos de câncer de colo de útero.
O projeto nasceu a partir da reivindicação das mulheres Yanomami durante o XIV Encontro das Mulheres Yanomami, realizado na Missão Catrimani em 2023. Hoje o projeto tem sido desenvolvido por meio de Transferência Executiva Descentralizada (TED) com financiamento da Funai, execução do Projeto Xingu da Unifesp em colaboração com o Dsei Yanomami e Ye'kwana e a Secretaria de Saúde Indiígena (Sesai).
A Unifesp possui uma larga e bem sucedida experiência nas ações de prevenção do CCU no Território Indígena do Xingu, tendo conseguido zerar a incidência de câncer de colo de útero no território, que é uma das principais causas de morte entre mulheres na Amazônia.
Durante o XVI Encontro das Mulheres Yanomami, elas reivindicaram que a Linha de Cuidado do Câncer do Colo de Útero na Terra Indígena Yanomami seja executada continuamente com a qualificação dos profissionais do Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami e Ye’kwana (DSEI-YY). Hoje, este projeto alcança apenas as regiões de Auaris, Maturacá, Inambu, Maiá, Waikás e Ericó. Embora abranja regiões populosas, o DSEI - Yanomami tem 37 regiões e muitas delas não estão cobertas pelo projeto por limitações orçamentárias.
“Ficamos muito preocupadas com esta doença que existe em nossa terra, pois está fazendo muitas mulheres sofrerem. Por isso, queremos que o projeto cuide das mulheres Yanomami de todas as regiões da Terra Indígena Yanomami. Estamos muito preocupadas com as palavras sobre estas doenças que podem atingir as mulheres. Temos muitas filhas, sobrinhas e netas, por isso ficamos preocupadas, queremos que todas sejam examinadas.” pontuam as Yanomami na carta.
Embora durante o Encontro todas as mulheres possam ter tido acesso ao exame de PCCU, Kawani é uma das comunidades que ainda não está incluída nas regiões atendidas pelo projeto e a moradora Roselita Yanomami afirmou que está preocupada com a saúde das filhas:
“Eu preciso me cuidar e fazer exame, a gente precisa que aconteça na nossa comunidade. Preciso desse direcionamento para esse programa funcionar, é importante fazer o exame do PCCU”, relatou Roselita.
Já Dalila Yanomami observou que há pelo menos três anos os exames de prevenção ao câncer de colo de útero não ocorrem na comunidade Maracanã, onde ela vive. Ela também pontuou a necessidade de que os homens yanomami façam exames, para evitar que eles infectem as mulheres.
“Reforço também que a gente faz esse exame, agora os homens podem estar contaminados ou não, eles precisam fazer exame para não transmitir doenças para nós, mulheres. Quando eu viajo pra cidade eu não sinto dor, mas, tem mulheres que não vão para a cidade então não sabem, muitas mulheres têm coceiras na vagina, isso é preocupante, quero que esse projeto se fortaleça para proteger as mulheres”, pontuou Dalila.
Outra reivindicação das Yanomami é que sejam contratadas Agentes de Saúde Indígena (AIS) mulheres. Falam que, para tratar da saúde da mulher, é essencial que tenham profissionais indígenas mulheres, para que possam se sentir mais à vontade para tratar de temas relacionados à saúde da mulher e ao pré natal.
O terceiro tópico do XVI Encontro de Mulheres Yanomami e da carta diz respeito à assistência social quando os Yanomami se deslocam à cidade de Barcelos, no Amazonas. As mulheres solicitam a execução adequada do crédito extraordinário direcionado aos Yanomami. Juntas, solicitam que a prefeitura do município de Barcelos dê suporte com a construção de uma casa de passagem para os indígenas, visto que há uma crescente presença de Yanomami em Barcelos para o recebimento dos benefícios sociais.
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Realizado em parceria entre a Tekohara Organização Zo’é, Iepé e ISA, “Zo’é rekoha – modo de vida zo’é” é narrado pela voz de quatro lideranças deste povo indígena que vive no Norte do Pará
“É muito bonito meu território! Neste mesmo território, os primeiros Zo’é já viviam antigamente, por isso ele é bonito!”. É assim que Supi Zo’é, uma das lideranças deste povo indígena apresenta a Terra Indígena Zo’é, no Norte do Pará, em um documentário que vem a público nesta segunda-feira (20/10).
Narrado pelas vozes de Tokẽ, Se’y, Awapo’í e Supi Zo’é, o vídeo “Zo’é rekoha – modo de vida zo’é” é fruto de uma parceria com a Tekohara Organização Zo’é e com Instituto Iepé, e abre uma nova janela de comunicação com o mundo zo’é na Enciclopédia Povos Indígenas no Brasil, do Instituto Socioambiental (ISA).
A produção foi realizada em maio de 2024, durante uma das primeiras viagens das lideranças zo’é à cidade de São Paulo (SP) – quando puderam conhecer mais sobre o modo de vida dos não indígenas nas grandes metrópoles, a atuação de organizações parceiras dos povos indígenas e visitar a Terra Indígena Tenondé Porã, do povo Guarani.
Incorporado ao novo verbete do povo Zo’é na Enciclopédia Povos Indígenas no Brasil, o documentário traz as vozes indígenas para o primeiro plano, lado a lado com o texto produzido pela antropóloga não indígena Dominique Tilkin Gallois – parceira histórica dos Zo’é e uma das mais antigas colaboradoras da pesquisa-movimento mantida há mais de 30 anos pelo ISA sobre a sociodiversidade indígena.
Os povos se apresentam
As autorias indígenas sempre fizeram parte desse movimento. No ano 2000, foi iniciada a série “Narrativas indígenas”, que apresentava depoimentos de lideranças de diferentes povos sobre temas fundamentais, como a chegada dos não indígenas e as explicações sobre as mudanças climáticas.
Na primeira edição da série, foram as vozes dos eminentes líderes Jurusi uhu, Pa'hi e Tatitu Zo’é, lado a lado com a de Dominique, que apresentaram a narrativa do herói mítico Jipohan, que recriou os Zo’é após um dilúvio e que tem roupas, gravadores e outras tecnologias como as dos kirahi, não indígenas. “Jipohan é gente como você”, conta Tatitu Zo’é à antropóloga no depoimento registrado em 1992.
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De lá pra cá, já foram publicadas 64 narrativas indígenas, além de incontáveis artigos e imagens de autoria indígena nos livros e sites mantidos pelo ISA. Sempre buscando não só divulgar a diversidade cultural e produzir informações qualificadas sobre o Brasil indígena, mas também reforçar a atualidade dos modos indígenas de existir e a imagem desses povos como autores de suas próprias narrativas.
É para dar continuidade a esse esforço histórico que inauguramos, com esse documentário, a série especial “Os povos se apresentam”, que traz conteúdos produzidos em estreita colaboração com pessoas e organizações indígenas. São vídeos, narrativas, imagens, clipes para redes sociais e outros materiais de autoria indígena que, agora, ganham destaque nesse site pioneiro e nos canais do ISA nas redes sociais.
Os Zo’é, em primeira pessoa
O convite para que as lideranças da organização Tekohara falassem em voz própria sobre seu território, seus cantos, festas, artesanato, roças e casas, simboliza a atual situação deste povo de contato recente – que hoje soma 350 pessoas.
No passado, os Zo’é viveram por anos sob uma política indigenista de isolamento, que buscava restringir sua interação com os não indígenas e com outros povos indígenas. Como escreve Dominique Tilkin Gallois no verbete do povo, eles “foram apresentados ao mundo em 1989, em reportagens que enfatizavam sua ‘pureza’ e ‘fragilidade’ e os descreviam como um dos últimos povos ‘intactos’ na Amazônia”.
Após superar a invasão de seu território por caçadores de felinos nos anos 1960,a instalação de uma base da Missão Novas Tribos (MNT) na TI Zo’é por anos a fio e as mortes causadas por falhas na assistência à saúde no final dos anos 1980, os Zo’é não só recuperaram sua população, mas também suas formas próprias de organização frente aos desafios da atualidade.
“Foi para tornar conhecidos os nossos pensamentos que nós tivemos essa ideia”, explica Supi Zo’é sobre a ideia de fundar a Tekohara, em 2022, com o apoio da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e do Instituto Iepé.
Hoje, eles estabeleceram suas próprias diretrizes para a proteção da TI Zo’é em um PGTA; consolidaram um programa de letramento não escolar; registram e traduzem seus cantos tradicionais; produzem livros para difundir os saberes zo’é; além de gerenciarem um fundo coletivo de artesanato, o FAZ, com apoio da Frente de Proteção Etnoambiental Cuminapenama (FPE-CPM), da Funai.
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No âmbito da Cooperação e Aliança no Noroeste Amazônico (ANA), povos indígenas da Bacia do Rio Tiquié realizam oficinas de sítios sagrados e segundo encontro de mulheres
Dando continuidade aos encontros da Canoita, retomados no ano passado, a nova etapa aconteceu na comunidade no Médio Rio Tiquié de Boca da Estrada, com a canoa descendo o rio, que secava rápido e despontava cachoeiras. Ali, a recepção foi marcada por cantos de boas vindas da escola, quinhampiras, beijus, mingaus e pela organização com a comunidade vizinha, Nova Esperança, para que os dois centros comunitários fossem ocupados.
Conforme a Canoita de maio em São Pedro, o encontro seria pela primeira vez neste trecho do rio para fortalecer o manejo da bacia e chegar a outras comunidades, uma vez que os diálogos, intercâmbios e trocas realizadas até então foram à montante, em comunidades mais próximas da região de fronteira.
As organizações indígenas ATRIART (Associação das Tribos Indígenas do Alto Rio Tiquié) e COITERTI (Consejo Indígena Del Territorio Del Río Tiquié), com a participação de lideranças, conhecedores das comunidades do Médio Tiquié e do igarapé Castanha e parceiros do Instituto Socioambiental (ISA) e da Fundação Gaia Amazonas fizeram duas programações distintas para os dias de trabalho, com momentos coletivos para pactuar combinados, socializar temas e fazer refeições.
No centro comunitário de Boca da Estrada a oficina focou nos sítios sagrados, discutindo o que são, elaborando traduções nas diferentes línguas, debatendo categorias e pesquisas realizadas, mapeando a região e incluindo conhecimentos dos locais onde o manejo deve ser feito com cuidado. Entre os participantes, estavam os conhecedores Bará, Tukano, Tuyuka, Yeba Masã que, junto a lideranças, professores, Agentes Indígenas de Manejo Ambiental (AIMAs) compartilharam histórias, exemplos do que evitar e propuseram técnicas de manejo. Diferentes categorias de sítios sagrados foram apontadas e relacionadas a narrativas de ocupação da região, assim como foram apresentadas e debatidas as políticas indígenas e seus instrumentos para gestão e governança do território dentro dos Estados brasileiro e colombiano.
Em paralelo, as mulheres se reuniram no centro comunitário da comunidade Nova Esperança, na qual vive majoritariamente o povo de etnia Hupd’äh. Juntas, mulheres brasileiras Hupd’äh, Yuhupdëh, Tuyuka, Tukano, Desano e mulheres colombianas de etnias Bará e Tuyuka realizaram o II Encontro de Mulheres do Rio Tiquié.
Em maio de 2024, foi realizado o I Encontro de Mulheres do Tiquié em Bellavista, durante a Canoita. A partir deste primeiro encontro, compreendemos que a realização de atividades que tenham como foco discussões de interesse e conhecimentos das mulheres, com espaços seguros para elaborarem e compartilharem experiências, são fundamentais para a participação e permanência delas dentro das atividades, associações, coletivos e redes.
Nesse sentido, com o intuito de proporcionar intercâmbios de experiências e conhecimentos entre as mulheres da Bacia do Rio Tiquié, tivemos como objetivo principal do segundo encontro construir entendimentos a partir do reconhecimento da importância do trabalho das mulheres indígenas no manejo da bacia.
Para isso, as mulheres indígenas discutiram e refletiram sobre sua atuação na produção de cuidados e manejo com o território que habitam. Os trabalhos realizados na roça, o conhecimento referente ao preparo de alimentos através da recuperação de receitas tradicionais, bem como a coleta de matéria prima para a produção de artesanatos foram compreendidos como atividades importantes para a proteção territorial.
Em meio às partilhas de receitas e de técnicas de produção de cerâmica e carajuru, as participantes chamaram a atenção para as mudanças climáticas que têm alterado a dinâmica de produção de alimentos e de coleta de matérias primas. Algumas dessas mudanças afetam as épocas em que se encontram as árvores frutíferas, os espinhos da casca da árvore de avina como ralador (utensílios de cozinha), o trabalho na roça — como os períodos de roçar e queimar, e o crescimento das plantações.
Ainda, através das discussões, ficou nítido que a participação das mulheres vai além do manejo do território: elas estão atentas às relações sociais advindas da transmissão de conhecimentos intergeracionais, bem como das trocas de sementes e mudas na Bacia do Tiquié. Ressaltam a importância da produção dos alimentos que sustentam os filhos, o marido, a comunidade e chamam a atenção aos cuidados e respeito com resguardos que devem realizar ao produzir e consumir determinados alimentos e na produção de alguns artesanatos.
O manejo do território pelas mulheres indígenas da Bacia do Rio Tiquié é realizado de forma ampla, se atentando ao manejo ambiental, mas também às relações sociais, à saúde e à proteção das pessoas que o habitam. Tal manejo, aliado à mobilização política, troca de experiências sobre gestão territorial e aos conhecimentos sobre o território fortalecem mais uma vez a pequena canoa.
Este evento e reportagem foram produzidos com apoio da Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD).
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Liderada pelo povo Juruna/Yudjá, a Canoada Xingu é uma expedição de 110km a remo pela Volta Grande do Xingu e acontece entre os dias 22 e 27 de novembro
A Canoada Xingu é uma experiência única de imersão na Amazônia, um mergulho profundo na natureza, na cultura e na realidade socioambiental de uma das regiões mais emblemáticas e ameaçadas da Amazônia, em um ano crucial para o futuro do Brasil e do planeta.
A expedição é liderada pelo povo Juruna/Yudjá, canoeiros ancestrais do Xingu, em parceria com o Instituto Socioambiental (ISA) e a Mazô Maná, com apoio do Fundo Amazônia e da Amazon Watch.
A primeira edição da Canoada aconteceu em 2014 como ato de defesa do Rio Xingu que passou a ser ameaçado pela construção e operação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Foi também um ato de resistência para chamar a atenção do mundo para os impactos de Belo Monte sobre rios, florestas e o modo de vida dos povos da Volta Grande do Xingu.
Hoje, a Canoada Xingu reforça o vínculo histórico e cultural com o rio e a identidade Juruna/Yudjá. Também mobiliza toda a comunidade em torno de uma atividade de turismo comunitário que faz frente ao desmatamento e à degradação, e que permite expressar a história de luta do povo pela vida em seu território ancestral.
A Canoada Xingu
A jornada acontece de 22 a 27 de novembro de 2025 na Volta Grande do Xingu, no Pará. A expedição parte de Altamira, município que mais emite gases do efeito estufa no Brasil, e percorre aproximadamente 110km a remo pelo Rio Xingu em direção à Terra Indígena Paquiçamba. Os viajantes remam em canoas tradicionais de madeira, conduzidos por experientes guias Juruna/Yudjá, testemunham as transformações causada por Belo Monte, conhecem as ameaças de Belo Sun, o novo projeto de mineração que pretende se instalar na região, vivenciam a biodiversidade única da Volta Grande e visitam aldeias e lugares sagrados da cultura Juruna/Yudjá, como a cachoeira do Jericoá, que é o símbolo do surgimento do mundo em sua mitologia.
Agenda da Canoada
● Dia 1: Chegada dos participantes e deslocamento para o Retiro Betânia, onde acontece uma reunião com os guias da Canoada, instruções sobre os protocolos de segurança e organização final de equipamentos.
● Dia 2: Início da Canoada. Saída de Altamira rumo à Praia do Tucum, onde acontece uma roda de conversa sobre os impactos de Belo Monte. Pernoite na Praia do Caju.
● Dia 3: O grupo rema até a Praia do Choro, na Terra Indígena Paquiçamba, onde irá pescar e participar de uma roda de conversa sobre o Território Juruna.
● Dia 4: Dia de atividades em terra. O grupo fará uma trilha até a Ilha do Zé Maria e depois participará de atividades de mergulho e observação de peixes, além de assistir a apresentações culturais. O pernoite, novamente, acontece na Praia do Choro.
● Dia 5: A Canoada segue para Jericoá com paradas para banho de rio e conversas.
● Dia 6: O dia começa com visita à cachoeira do Jericoá. No horário do almoço, há a opção de retornar à Altamira em uma viagem de carro que leva cerca de duas horas. Para quem ficar, há a opção de visitar a cachoeira do Camaleão e pernoitar em Jericoá.
● Dia 7: Após o café da manhã, o grupo parte para Altamira em uma viagem de carro que leva cerca de duas horas.
Observações: Pernoites são feitos em barracas nas praias ou em redes com mosquiteiros. Os participantes são responsáveis por levar seus equipamentos pessoais como, redes, mosquiteiros e barracas.
Sobre os Juruna/Yudjá
Os Juruna/Yudjá são o povo canoeiro da Volta Grande do Xingu que habita, desde tempos imemoriais, as ilhas e penínsulas do Baixo e Médio Xingu, um dos rios mais importantes da Amazônia Meridional. Há cerca de cem anos, em consequência dos ataques sofridos contra sua população por parte das frentes de expansão não-indígenas na região, os Juruna/Yudjá acabaram se dividindo em dois grupos. Uma parte do coletivo indígena, cerca de doze pessoas, permaneceu na Volta Grande do Xingu criando a Terra Indígena Paquiçamba e preservando o território ancestral. Outra parte, cerca de 150 pessoas, remaram para a região do Alto Rio Xingu e se estabeleceram no Território Indígena do Xingu, em Mato Grosso, preservando a língua e outras tradições culturais.
Desde 2011, esses dois grupos protagonizam um processo de intercâmbio e de trocas entre parentes para reforçar sua matriz cultural e suas relações de parentesco após mais de cem anos de separação, marcados pelos impactos da colonização, do ciclo da borracha, da abertura da Transamazônica e, mais recentemente, da usina de Belo Monte. A Canoada no Xingu reforça esse vínculo histórico e cultural com o rio, paisagem viva da memória passada e presente da identidade Juruna/Yudjá. Remar junto aos Juruna/Yudjá da Volta Grande é celebrar esse vínculo de luta, resistência e a história de defesa pela vida e pelas águas do Rio Xingu.
Pacotes
O pacote individual custa R$ 9.900,00 . O valor inclui hospedagem em Altamira, deslocamentos locais, refeições durante toda a jornada, guias, canoas e remos, coletes, equipe médica de apoio e registros audiovisuais. O pacote não incluí o trajeto aéreo até Altamira, no Pará, barracas, redes, mosquiteiros e itens de uso pessoal.
Para mais informações sobre valores e reservas (WhatsApp): +55 93 99129‐2846.
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Documento será entregue em cerimônia em Brasília, com presença de autoridades federais, incluindo presidente Lula e ministros
O Fórum Memória, Verdade, Reparação Integral, Não Repetição e Justiça para os Povos Indígenas, apresentará ao governo federal a minuta de criação da Comissão Nacional Indígena da Verdade (CNIV), que deve ser instituída pelo Estado brasileiro para promover a reparação integral às violações cometidas contra os povos indígenas no país durante a ditadura militar. O documento será entregue em cerimônia no dia 21 de outubro, às 15h, no Auditório do Centro Cultural de Brasília (CCB).
A iniciativa é liderada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). Entre os convidados para o evento estão o presidente Lula e as ministras Sonia Guajajara (Povos Indígenas), Macaé Evaristo (Direitos Humanos), Marina Silva (Meio Ambiente), Anielle Franco (Igualdade Racial), os ministros Ricardo Lewandowski (Justiça), Rui Costa (Casa Civil) entre outros. Também foi convidado o procurador-geral da República, Paulo Gonet.
“O objetivo é que o Estado brasileiro reconheça e assuma sua responsabilidade pelas graves violações de direitos humanos praticadas por suas próprias instituições contra os povos indígenas, que incluíram assassinatos, remoções forçadas, envenenamentos, sequestros de crianças, contaminação intencional por doenças infecto-contagiosas, além do esbulho de terras”, explica a antropóloga e jornalista Tatiane Klein, que representa o Instituto Socioambiental (ISA) no Fórum. “A criação de uma comissão específica para investigar essas violações foi recomendada pela própria CNV, em 2014, e é fundamental para assegurar o direito à memória desses povos”.
A iniciativa responde a uma recomendação feita pela Comissão Nacional da Verdade (CNV) em 2014, quando revelou a morte de ao menos 8.350 indígenas por ações e omissões de agentes do Estado durante o período investigado, número quase 20 vezes maior que o total de mortos e desaparecidos políticos (434). A própria CNV reconheceu que o dado estava muito abaixo da realidade, já que a apuração abrangeu apenas dez povos indígenas, entre os 305 existentes no país, e recomendou a criação de uma Comissão Nacional Indígena da Verdade (CNIV) para aprofundar essas investigações.
Fórum
O Fórum é uma iniciativa multissetorial instituída em 2024 para investigar, resgatar a verdade e garantir reparação às diversas formas de violências cometidas pelo Estado brasileiro contra os povos indígenas por meio de órgãos como o Serviço de Proteção ao Índio (SPI) e a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). O espaço reúne mais de 60 adesões de organizações indígenas como a Apib, entidades da sociedade civil como o ISA, além de representantes de órgãos públicos e instituições acadêmicas.
“O movimento indígena e suas organizações parceiras da sociedade civil foram fundamentais para apoiar o trabalho da Comissão Nacional da Verdade (CNV) há onze anos e agora estão chamando o Estado brasileiro a essa tarefa urgente de continuar investigando as violações de direitos humanos dos povos indígenas – para que elas não sejam esquecidas e parem de ser repetidas”, comenta Tatiane Klein.
Em um ano, foram realizadas 16 plenárias e sistematizadas informações de mais de 80 casos de povos indígenas que tiveram seus direitos violados. O grupo de trabalho coordenado pelo fórum, com participação da historiadora Luma Prado, do ISA, ampliou significativamente o levantamento da CNV, reunindo novas evidências em acervos e arquivos de instituições parceiras, como o Acervo Socioambiental. “A criação da Comissão Nacional Indígena da Verdade (CNIV) é um passo fundamental para aprofundar essas investigações e garantir o direito à verdade, à memória e à reparação aos povos indígenas”, afirma a historiadora.
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Antropólogo que dirigiu o Parque Indígena do Xingu após Orlando Villas-Bôas marcou o indigenismo brasileiro ao nomear os primeiros chefes de posto indígenas na Funai
O Instituto Socioambiental (ISA) se despede de Olympio Trindade Serra com tristeza e deferência. Podemos dizer, sem medo de exagerar, que bem antes de se falar em "protagonismo indígena", ou de estar estruturado o campo político que triunfou na Constituição de 1988 para os direitos dos povos indígenas, houve um antropólogo que, ineditamente, nomeava dois indígenas para assumirem cargos administrativos na Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) que, até então, eram exercidos exclusivamente por funcionários não indígenas.
Olympio Serra foi diretor do Parque Indígena do Xingu (PIX) depois de Orlando Villas-Bôas. Aliados e companheiros, Olympio concebeu, delicadamente, seu conceito de gestão do PIX que admitia, ser ali, não uma dádiva da política pública para povos indígenas, mas sim um território que pudesse ser apropriado por quem deu-lhe conteúdo e consistência.
Megaron Txukarramãe e Mairawë Kayabi foram nomeados "Chefes de Posto" do Diauarum (no Médio PIX) e do Kretire (no Baixo PIX) por Olympio Serra. Apenas o Alto PIX, onde se localiza ainda hoje o Posto Indígena Leonardo Villas-Bôas, manteve um funcionário não indígena da Funai que, ainda assim, em 1987 passou a ser gerido por Pirakumã Yawalapiti, expressando o legado de Olympio para a política indigenista naquela terra indígena que, por muitos anos, insistia-se ser a última reserva indígena possível de um Brasil militarizado e desenvolvimentista.
O ISA ouviu a antropóloga Ana Gita de Oliveira, discípula de Olympio Serra, e sua amiga de "todos os momentos", como ela mesma expressa. Gita concorda que foi ele o grande responsável por realizar em uma Funai da ditadura militar, coordenado o setor de estudos e pesquisas da autarquia. São palavras dela: "naqueles tempos sombrios, [Olympio] teve a coragem de chamar antropólogos para implementarem um grande projeto de esperança para os povos indígenas por meio de políticas específicas, uma iniciativa inédita e progressista com grande repercussão no campo indigenista". A consequência da ousadia resultou na demissão dele e de outros tantos antropólogos que se posicionaram contra os desmandos dos militares.
Veja homenagem da ABA:
Fora da Funai, relata Gita, Olympio foi chamado por Aloisio Magalhães para integrar o corpo de pesquisadores da então recém criada Fundação Nacional Pró- Memória, onde me acolheu e, juntos, criamos a setor de Etnias e Sociedade Nacional, inédito no campo das políticas de salvaguarda do patrimônio cultural que teria vida institucional longa. Posteriormente, essa experiência seria integrada ao Departamento do Patrimônio Imaterial do IPHAN, que em sua história recente pode, também de forma inédita, tratar das políticas de salvaguarda dos povos indígenas, dos movimentos negros, quilombolas e das comunidades tradicionais.
Em 1994, Olympio Serra foi chamado por Megaron Txukarramãe, então diretor do PIX, para compor a diretoria da ONG Associação Vida e Ambiente criada por seu tio, Raoni Metuktire, com o apoio de seu amigo, o cantor Sting.
Importante mencionar a defesa de Olympio em favor dos terreiros de candomblé e de todos os movimentos negros – ou de pretos – como dizia. Dentro da Fundação Pró-Memória, herdada pelo Iphan no Ministério da Cultura, ele fazia lembrar, incansavelmente, que a presença da cultura imaterial de pretos e indígenas era tão ou mais importante do que a salvaguarda dos patrimônios de origem europeia geralmente representados pela materialidade de casarões portugueses. A presença indígena nos blocos de pretos do carnaval da Bahia era - e ainda é - como ele insistia, a maior prova dessa sempre viva herança cultural.
Siga em paz, Olympio! Você vai fazer falta.
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Primeira temporada apresenta histórias de resistência e ancestralidade com mulheres do povo Mura, Pankará, Quechua, Guarani e Yanomami
O Instituto Socioambiental (ISA) lança nesta terça-feira (30/09) o segundo episódio da primeira temporada do podcast “Floresta no Centro”, criado para estimular escutas e trocas sobre territórios, culturas e resistências.
Na conversa "Mulheres indígenas na cidade", a artista Auá Mendes, do povo Mura, a pedagoga e doutora em antropologia Chirley Pankará, do povo Pankará em Pernambuco, a artista andina Fernanda Quechua, natural da Bolívia, e Natali Mamani indigena Aymara, cineasta da rede Katahirine, refletem sobre os caminhos e atravessamentos de suas vivências urbanas, marcadas por arte, memória, enfrentamento e pertencimento. Com a mediação de Luma Prado, historiadora, pesquisadora e articuladora no ISA, elas também compartilham formas de resistir nas cidades, mantendo vivas suas raízes e modos de vida.
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O podcast é gravado durante os eventos presenciais no espaço do ISA na Galeria Metrópole, na capital paulista. Lá, saberes de comunidades do Xingu, Rio Negro e Vale do Ribeira, são apresentados para os visitantes por meio de eventos presenciais e oficinas e comercialização de publicações da organização e de parceiros, jóias, objetos de decoração e alimentos.
Com a realização do Instituto Socioambiental (ISA), o projeto faz parte de um esforço coletivo para amplificar vozes originárias e tradicionais.
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Ouça o episódio abaixo
Créditos
Identidade visual: Camaleão
Captação de áudio, identidade sonora e edição: Voz Ativa Produções
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Contribuições seguiram para a etapa estadual, em Manaus, e integrarão o documento único que os povos indígenas levarão como contribuição coletiva à COP30
Nos dias 16 e 17 de setembro, a Casa do Saber da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn), em São Gabriel da Cachoeira (AM), recebeu a etapa Rio Negro da Pré-COP Parente, encontro que reuniu cerca de 100 lideranças indígenas Rio Negro. Com a presença da ministra dos Povos Indígenas (MPI), Sonia Guajajara, o seminário abriu espaço para debates sobre territórios, políticas climáticas e a participação indígena na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), que será realizada em novembro, em Belém.
O ciclo é realizado em parceria com a Articulação das Organizações e Povos Indígenas do Amazonas (Apiam), a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e o MPI.
Durante dois dias de programação, foram discutidos temas como ameaças e defesa dos territórios, crise climática, créditos de carbono, fundos de financiamento climático, sociobioeconomia e sustentabilidade. As lideranças também aprofundaram reflexões sobre o papel das ciências indígenas na mitigação e adaptação às mudanças climáticas e sobre a necessidade de ampliar a presença dos povos indígenas nos espaços de decisão em nível estadual, nacional e global.
Dario Baniwa, presidente da Foirn, apresentou um panorama sobre o contexto territorial do Rio Negro, destacando avanços conquistados pelas comunidades, como as iniciativas de turismo de base comunitária, a Casa de Artesanato Wariró – fruto da organização das mulheres indígenas –, os Planos de Gestão Territorial e Ambiental (PGTAs) e a criação do Fundo Indígena do Rio Negro (FIRN), mecanismo voltado para apoiar a implementação desses planos.
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Ele também alertou para os desafios que ameaçam a região, como o garimpo ilegal, o tráfico de drogas, a morosidade na demarcação de terras e os impactos das mudanças climáticas. Dário destacou a importância do evento como “um momento de diálogo, escuta e de trazer nossas demandas, para que as lideranças não apenas levem as discussões à COP, mas também retornem aos territórios e comunidades, compartilhando as informações com os parentes que ficaram”.
O coordenador-geral da Coiab, Toya Manchineri, chamou atenção para os impactos de propostas legislativas que fragilizam os direitos indígenas e colocam em risco a proteção territorial. Ele citou projetos como o chamado “PL da devastação” e o PDL 717/2024, que dificultam ainda mais os processos de demarcação de terras, reforçando a necessidade de fortalecer a mobilização e a articulação política para garantir a integridade dos territórios e os direitos constitucionais dos povos indígenas.
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A ministra Sonia Guajajara, em sua apresentação, destacou o caráter preparatório da Pré-COP Parente e reforçou que o ciclo de encontros, que tem percorrido todos os biomas, tem justamente o objetivo de escutar as lideranças, reunir propostas e fortalecer a presença indígena na COP30. “É uma honra voltar aqui no Rio Negro e neste momento enquanto ministra de Estado dos Povos Indígenas trazendo esse tema da Conferência do Clima. Um tema que é tão real no dia a dia, nas nossas comunidades, nossos povos que já sentem esse impacto das mudanças climáticas”, afirmou a ministra.
Ela ressaltou que a crise climática afeta de forma desigual diferentes regiões e povos, mas que todos já percebem os efeitos do aumento da temperatura e das alterações nos regimes de chuva, o que torna urgente a construção de respostas conjuntas.
A ministra também reafirmou o compromisso do governo em garantir paridade na participação nos espaços de discussão e decisão, defendendo o protagonismo indígena e a paridade na participação entre homens, mulheres, jovens e anciãos. Segundo ela, assegurar equilíbrio na composição das mesas e painéis é essencial para que diferentes visões e cosmovisões indígenas estejam representadas, fortalecendo a contribuição dos povos na construção de soluções para a crise climática.
Carta de Direitos Climático das Juventudes do Rio Negro
Um dos momentos simbólicos do encontro foi a participação da juventude indígena. A coordenadora do Departamento de Adolescentes e Jovens da Foirn Jucimeyre Garcia fez a entrega simbólica da Carta de Direitos Climáticos das Juventudes do Rio Negro à ministra Sonia Guajajara. Construído coletivamente, o documento elenca dez propostas prioritárias para efetivar os direitos climáticos nos territórios da região e ainda passa por ajustes finais antes da entrega oficial.
A carta é fruto de encontros e grupos de estudos sobre justiça climática e racismo ambiental conduzidos em parceria com o Instituto Socioambiental (ISA) e reforça a importância da juventude indígena como protagonista nas lutas por políticas climáticas mais justas e inclusivas.
Num segundo momento, reunidos em grupos de trabalho, as lideranças debateram as demandas territoriais dentro dos eixos prioritários de Direitos Humanos, Ambientais e Territoriais; Fundos de Financiamento Climático; Sociobioeconomia e Sustentabilidade; e Participação Indígena na COP30.
As discussões deram origem a uma carta que reafirma os territórios indígenas como resposta concreta à crise climática. “Por milênios, os povos indígenas do Rio Negro vêm manejando a floresta com sabedoria, mantendo a biodiversidade, cuidando dos rios e garantindo o equilíbrio ambiental essencial para toda a humanidade”, destaca o documento.
Entre as propostas apresentadas, as lideranças defendem que a demarcação das Terras Indígenas seja tratada como uma estratégia estruturante de mitigação e adaptação climática. Destacam a necessidade de que o governo brasileiro inclua metas claras e prazos definidos no compromisso climático nacional (NDC) e que essa agenda seja reconhecida como essencial para a integridade dos ecossistemas e da vida no planeta. Também, reivindicaram que a proteção das terras já demarcadas seja reforçada com maior presença do Estado para fiscalização e monitoramento, especialmente nas áreas de fronteira, diante das pressões que ameaçam a região, como narcotráfico e garimpo ilegal.
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Outro ponto central foi a garantia de financiamento direto às organizações indígenas, sem a necessidade de intermediários e de forma simplificada e desburocratizada, facilitando o acesso pelas associações de base. A reivindicação é que de 20% a 50% dos recursos de fundos climáticos, nacionais e internacionais, como o Fundo Amazônia e o TFFF (Tropical Forests Forever Facility) – proposto pelo Brasil para recompensar países que conservam suas florestas tropicais – sejam destinados a iniciativas protagonizadas pelos povos indígenas. A valorização de mecanismos próprios de gestão, como o Fundo Indígena do Rio Negro (FIRN), além de salvaguardas que assegurem que os recursos cheguem de forma transparente e eficiente até as comunidades, também foram pontuados.
As lideranças também reforçaram a importância de fortalecer os Planos de Gestão Territorial e Ambiental (PGTAs) já existentes e de criar políticas públicas específicas para sua implementação. A revogação de leis e projetos que fragilizam os direitos constitucionais indígenas e a proibição da mineração em terras indígenas também foram medidas pontuadas para garantir a integridade cultural e ambiental dos territórios.
A carta final ainda destacou a necessidade de reconhecer as ciências e tecnologias indígenas como parte das soluções globais para a crise climática, defendendo que seus conhecimentos sejam tratados em igualdade com as tecnologias convencionais, com incentivo a pesquisas conduzidas por indígenas, valorização das medicinas tradicionais e fortalecimento de espaços como as Casas do Saber, que promovem a transmissão intergeracional de saberes.
Outro eixo relevante foi o das economias sustentáveis e da soberania alimentar, com propostas de investimentos no fortalecimento da agricultura tradicional, do manejo comunitário e de cadeias produtivas como a pesca, o artesanato e o turismo de base comunitária.
A educação indígena diferenciada também entrou como parte da agenda climática como política estratégica para a justiça social e climática, com escolas e universidades indígenas fortalecidas, currículos próprios, bilíngues e adequados à realidade de cada povo. Além disso, destacaram a importância da formação continuada de professores e da valorização das línguas indígenas como forma de preservar conhecimentos ancestrais.
Por fim, o documento reafirma a urgência de ampliar a representação indígena nos espaços de decisão internacionais, garantindo a presença de mulheres, jovens e anciãos e criando um comitê próprio para monitorar e incidir sobre as decisões da COP30.
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Evento em São Paulo recebe lideranças indígenas Xetá – que foram vítimas de uma tentativa de extermínio nos anos 1940, no Paraná, e hoje usam suas artes e saberes para lutar por seus direitos
No dia 25 de setembro, quinta-feira, às 19h, o espaço Floresta no Centro, em São Paulo (SP), do Instituto Socioambiental (ISA), receberá o evento “Artes e resistências do povo Xetá”, uma roda de conversa com as lideranças indígenas Itakã Xetá (Claudemir da Silva), guardião dos cantos e da língua Xetá, e Arwáj Xetá (Dival da Silva), artesão e guardião das histórias xetá.
O evento tem como objetivo trazer para diálogo as memórias e saberes que vêm sendo utilizadas por esse povo para resistir ao genocídio ao longo de décadas de resistências e retomada.
A mediação fica a cargo do antropólogo não indígena Rafael Pacheco, pesquisador do Centro de Estudos Ameríndios da Universidade de São Paulo (CEstA-USP). O evento é uma realização do ISA em parceria com a Associação Indígena da Etnia Xetá (AIEX).
Nos anos 1940, no Paraná, o povo Xetá resistiu a uma tentativa de extermínio que reduziu sua população, gerando um grave processo de desagregação social. Neste período, a colonização no noroeste do Paraná levou à invasão do território xetá, cujas terras foram ilegalmente cedidas pelo Estado a empresas privadas, como a Companhia Brasileira de Imigração e Colonização (Cobrimco).
Sequestro de crianças, separação familiar, massacres, remoção forçada, destruição de aldeias e exploração de trabalho análogo à escravidão são algumas das graves violações de direitos humanos a que os Xetá foram submetidos por ação ou omissão do estado brasileiro, segundo o relatório final da Comissão Nacional da Verdade (CNV), em 2014. O caso foi alvo também das investigações da Comissão Estadual da Verdade do Paraná (CEV-PR) e de investigações que estão sendo conduzidas por pesquisadores indígenas da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB).
Hoje o povo se recuperou e são mais de 200 pessoas xetá, que vivem em diferentes regiões do estado do Paraná, e que periodicamente se reúnem em “encontros pela vida” – buscando reunir seus parentes, recuperar sua língua e demarcar seu território, a Terra Indígena Herekarã Xetá – uma área de aproximadamente 3000 hectares, localizada no município de Ivaté, no Paraná, mas que ainda não teve seu processo de demarcação finalizado.
Um dos primeiros encontros foi realizado em 1997, com o apoio do ISA, em Curitiba, reunindo alguns dos sobreviventes do genocídio xetá para discutir perspectivas de futuro para seus descendentes e contornar a disperação e separação forçadas. Em 2019, aconteceu o mais recente desses encontros, que foi relatado por Dival da Silva, Claudemir da Silva e Rafael Pacheco no livro Povos Indígenas no Brasil 2017-2022, do ISA, e reuniu familiares de diversas localidades na TI São Jerônimo da Serra, onde está um dos maiores núcleos populacionais dos Xetá na atualidade.
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O evento abordará os cantos, memórias e histórias Xetá, propondo um mergulho nos aspectos contemporâneos da vida xetá na importância de seus saberes e fazeres tradicionais para fortalecer seu modo de existir. Além da roda de conversa, o evento contará ainda com a venda de artesanatos e a exibição do documentário “Somos Xetá”, dirigido pelos cineastas Nyathe, Tikone e Leandro Xetá.
Serviço
Evento: “Artes e resistências do povo Xetá” – Roda de conversa com lideranças indígenas e guardiões das artes xetá, com Itakã Xetá (Claudemir da Silva) e Arwáj Xetá (Dival da Silva) e Rafael Pacheco (CEstA-USP)
Data: Quinta-feira, 25 de setembro de 2025
Horário: 19h
Local: Floresta no Centro. Av. São Luiz, 187 - Galeria Metrópole - loja 28 - 2º piso - São Paulo (SP)
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Evento gratuito em São Paulo reúne exibições de filmes, mesas de debate e apresentações científicas
A Cinemateca Brasileira promove, nos dias 11 e 12 de setembro, o seminário “Olhares cruzados França-Brasil sobre os desafios da preservação e do acesso ao patrimônio audiovisual: foco na memória audiovisual dos Povos Indígenas”, parte da Temporada França-Brasil 2025 e patrocinado pelo Serpro. O evento, gratuito, contará com tradução simultânea francês-português, interpretação em Libras e transmissão ao vivo pelo canal da Cinemateca no YouTube.
Confira a programação completa
Valorizando a memória dos povos indígenas, o seminário discutirá os desafios da preservação e do acesso ao patrimônio audiovisual, com foco na memória indígena. O encontro inclui mesas de debate e sessões de filmes em São Paulo, a partir de acervos do Instituto Nacional do Audiovisual (INA), da França, e da própria Cinemateca, com apoio do Laboratório de Imagem e Som em Antropologia da USP (LISA) e do Instituto Socioambiental (ISA).
O seminário discutirá a colaboração internacional, preservação do patrimônio audiovisual e iniciativas científicas conduzidas pelo INA e parceiros brasileiros, com a presença de representantes de povos indígenas, instituições, profissionais do setor e pesquisadas mesas abordarão os desafios e conquistas na aquisição e preservação de material audiovisual sobre os povos indígenas brasileiros, além da produção audiovisual realizada por grupos indígenas.
Um dos destaques do evento será a Mesa-Redonda 3, às 14h do dia 11, que apresentará e debaterá iniciativas científicas brasileiras relacionadas à memória audiovisual dos povos indígenas, com a presença da antropóloga Tatiana Maira Klein e da bibliotecária Adriana Miranda, ambas colaboradoras do ISA.
Outros especialistas participarão das mesas, como Kerexu'i Martim (documentarista Guarani), Gabriela Sousa de Queiroz (Cinemateca Brasileira), Karkaju Pataxó (Ministério dos Povos Indígenas), Drika de Oliveira (FIAF), Idjahure Terena (pesquisador Terena), Tamara Santos (Cinemateca Brasileira), Géraldine Poels (INA) e Maria Dora Mourão (diretora-geral da Cinemateca).
A exibição de registros dos acervos do INA e da Cinemateca Brasileira mostrará a diversidade da memória audiovisual dos povos indígenas. Também será exibida a cópia restaurada do documentário Quelque Chose De L'arbre, Du Fleuve, Et Du Cri Du Peuple (1980), com debate do diretor Patrice Chagnard. Lançado em 1980, o longa mostra a luta das comunidades camponesas do nordeste brasileiro contra grandes proprietários e empresas multinacionais, em três momentos do despertar da consciência de um povo.
Mesa-Redonda 3 | Apresentações e debate sobre iniciativas científicas brasileiras relacionadas à memória audiovisual dos povos indígenas do país
Dia: 11/09
Horário: 14h
Onde: Cinemateca Brasileira (Largo Sen. Raul Cardoso, 207 - Vila Clementino, São Paulo)
Moderador: Eduardo Morettin - Professor do Departamento de Cinema, Rádio e Televisão, USP
Painelistas:
Sylvia Caiuby Novaes e Mariana Floria Baumgaertner - LISA - Laboratório de Imagem e Som em Antropologia, USP
Tatiane Maira Klein e Adriana Miranda - ISA - Instituto Socioambiental
Karkaju Pataxó - Coordenador Geral de Promoção a Políticas Culturais do Ministério dos Povos Indígenas (MPI)
Ianara Apolônio Xokó - Historiadora, antropóloga e professora Xokó
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