Documento foi elaborado durante o XVI Encontro de Mulheres Yanomami com assinatura de 67 lideranças femininas da maior Terra Indígena do Brasil
Sessenta e sete mulheres Yanomami assinaram uma carta se posicionando contra a mineração em Terras Indígenas e pedindo para que autoridades não indígenas “parem de mexer com essa palavra sobre mineração”. O documento, divulgado nesta terça-feira (21/10), foi elaborado durante o XVI Encontro de Mulheres Yanomami, na comunidade Kawani, no Rio Mapulaú, afluente do Rio Demini, no Amazonas, que ocorreu entre 22 e 26 de setembro e contou com participantes de 40 comunidades de sete regiões da Terra Indígena Yanomami.

“Nós, mulheres Yanomami, queremos dizer para vocês, autoridades não indígenas, que parem de falar sempre sobre aquilo que vocês chamam de mineração, que parem de mexer com essas palavras sobre “mineração em Terras Indígenas”, pois não vamos deixar que vocês se aproximem de nossas terras, não aceitamos a mineração na floresta onde vivemos e queremos que vocês desistam disso”, diz trecho do documento.
A carta também conta com reflexões sobre a saúde das mulheres Yanomami, especialmente no que diz respeito à prevenção do câncer do colo de útero, e sobre a necessidade de assistência social aos indígenas quando precisarem se deslocar à cidade. Os tópicos também foram discutidos durante o XVI Encontro de Mulheres.

Durante o evento, as mulheres assistiram a filmes que explicam o que é mineração e os impactos que pode causar. A partir dos filmes, foram feitas reflexões sobre os estragos que o garimpo ilegal causou nos últimos anos no território Yanomami. A partir dos filmes e das discussões feitas, as participantes do encontro afirmam categoricamente que não desejam ver grandes maquinários adentrarem a floresta para causar destruição.
“Vimos imagens de mineração durante nosso encontro e algumas de nós não dormiram. Ficamos muito preocupadas: ‘Hoo... por que os napëpë querem fazer esta coisa assustadora com a floresta? Por que fazem isto?’ E pensamos em nossos filhos com preocupação: ‘como eles irão ficar? Se a mineração chegar aqui, o que vai acontecer conosco? Onde nossos filhos irão poder dormir bem? Por que as pessoas procuram minérios em nossa terra?’”, aponta trecho da carta.
Em agosto deste ano, a Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado aprovou o PL 1.331/2022, que autoriza pesquisa e garimpo em Terras Indígenas. O texto, proposto pelo senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR) e aprovado com a relatoria de Damares Alves (Republicanos-DF), seguiu para a Comissão de Meio Ambiente e aguarda a escolha de um relator.
“Não aceitamos mineração na Terra Indígena Yanomami, pois não queremos que façam sofrer nossos filhos. Nós, mulheres Yanomami, não queremos que o projeto de mineração seja aprovado”, dizem as mulheres Yanomami.
Ainda conforme a carta, as Yanomami temem que garimpeiros cometam violência sexual contra suas filhas, se preocupam com a contaminação dos rios, peixes, o impacto na caça e a destruição da floresta. Elas pedem que as autoridades e governantes não indígenas levem as palavras delas a sério.
Saúde das mulheres Yanomami
Durante as conversas sobre saúde, as Yanomami reivindicaram a ampliação do projeto Construção da Linha de Cuidado do Câncer do Colo de Útero (CCU) na Terra Indígena Yanomami, que visa a construção de uma cadeia de prevenção e diagnóstico precoce das lesões precursoras para evitar casos de câncer de colo de útero.
O projeto nasceu a partir da reivindicação das mulheres Yanomami durante o XIV Encontro das Mulheres Yanomami, realizado na Missão Catrimani em 2023. Hoje o projeto tem sido desenvolvido por meio de Transferência Executiva Descentralizada (TED) com financiamento da Funai, execução do Projeto Xingu da Unifesp em colaboração com o Dsei Yanomami e Ye'kwana e a Secretaria de Saúde Indiígena (Sesai).
A Unifesp possui uma larga e bem sucedida experiência nas ações de prevenção do CCU no Território Indígena do Xingu, tendo conseguido zerar a incidência de câncer de colo de útero no território, que é uma das principais causas de morte entre mulheres na Amazônia.

Durante o XVI Encontro das Mulheres Yanomami, elas reivindicaram que a Linha de Cuidado do Câncer do Colo de Útero na Terra Indígena Yanomami seja executada continuamente com a qualificação dos profissionais do Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami e Ye’kwana (DSEI-YY). Hoje, este projeto alcança apenas as regiões de Auaris, Maturacá, Inambu, Maiá, Waikás e Ericó. Embora abranja regiões populosas, o DSEI - Yanomami tem 37 regiões e muitas delas não estão cobertas pelo projeto por limitações orçamentárias.
“Ficamos muito preocupadas com esta doença que existe em nossa terra, pois está fazendo muitas mulheres sofrerem. Por isso, queremos que o projeto cuide das mulheres Yanomami de todas as regiões da Terra Indígena Yanomami. Estamos muito preocupadas com as palavras sobre estas doenças que podem atingir as mulheres. Temos muitas filhas, sobrinhas e netas, por isso ficamos preocupadas, queremos que todas sejam examinadas.” pontuam as Yanomami na carta.
Embora durante o Encontro todas as mulheres possam ter tido acesso ao exame de PCCU, Kawani é uma das comunidades que ainda não está incluída nas regiões atendidas pelo projeto e a moradora Roselita Yanomami afirmou que está preocupada com a saúde das filhas:
“Eu preciso me cuidar e fazer exame, a gente precisa que aconteça na nossa comunidade. Preciso desse direcionamento para esse programa funcionar, é importante fazer o exame do PCCU”, relatou Roselita.
Já Dalila Yanomami observou que há pelo menos três anos os exames de prevenção ao câncer de colo de útero não ocorrem na comunidade Maracanã, onde ela vive. Ela também pontuou a necessidade de que os homens yanomami façam exames, para evitar que eles infectem as mulheres.
“Reforço também que a gente faz esse exame, agora os homens podem estar contaminados ou não, eles precisam fazer exame para não transmitir doenças para nós, mulheres. Quando eu viajo pra cidade eu não sinto dor, mas, tem mulheres que não vão para a cidade então não sabem, muitas mulheres têm coceiras na vagina, isso é preocupante, quero que esse projeto se fortaleça para proteger as mulheres”, pontuou Dalila.
Outra reivindicação das Yanomami é que sejam contratadas Agentes de Saúde Indígena (AIS) mulheres. Falam que, para tratar da saúde da mulher, é essencial que tenham profissionais indígenas mulheres, para que possam se sentir mais à vontade para tratar de temas relacionados à saúde da mulher e ao pré natal.
O terceiro tópico do XVI Encontro de Mulheres Yanomami e da carta diz respeito à assistência social quando os Yanomami se deslocam à cidade de Barcelos, no Amazonas. As mulheres solicitam a execução adequada do crédito extraordinário direcionado aos Yanomami. Juntas, solicitam que a prefeitura do município de Barcelos dê suporte com a construção de uma casa de passagem para os indígenas, visto que há uma crescente presença de Yanomami em Barcelos para o recebimento dos benefícios sociais.