Assentados demonstram que é possível articular produção de alimentos saudáveis, geração de renda e floresta em pé; conheça essa história inspiradora!
No meio de extensas plantações de monoculturas, como a da soja, pequenos agricultores familiares mostram que é possível aliar restauração de florestas com a geração de renda a partir da produção de alimentos orgânicos.
O projeto "Conectividade Ecológica e Econômica no Xingu Araguaia", faz a conexão de restauração de florestas em fluência com o cultivo sustentável garantindo a manutenção, restauração e manejo das áreas degradadas e o estímulo de hortas agroecológicas e quintais produtivos nas bacias dos rios Xingu e Araguaia, no Mato Grosso.
Iniciado em 2020, o projeto faz parte do Programa REDD Early Movers (REM) Mato Grosso, e com a parceria do Instituto Socioambiental (ISA), junto às suas associações de pequenos agricultores, promovem melhorias em suas produções utilizando a restauração de florestas e áreas degradadas como base fundamental.
Os Projetos de Assentamento Guatapará, localizado em Canarana, Pé da Serra e Beira Rio de Nova Xavantina e o Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) Bordolândia, em Serra Nova Dourada, foram os três projetos de assentamentos da reforma agrária na região de Mato Grosso contemplados com o projeto.
As atividades envolveram o acompanhamento técnico para o manejo e fertilidade do solo, o aumento da produtividade, e a produção de alimentos diversificados sem veneno pela agricultura familiar que otimizaram diretamente a geração de renda extra para 47 famílias agricultoras.
A restauração de áreas prioritárias, como as Áreas de Preservação Permanente (APPs) foi o ponto alto dessa ação, como explica Guilherme Pompiano, técnico de restauração do ISA e coordenador do projeto.
“Esse é um trabalho que pode parecer até de formiguinha frente a uma região que deve ter mais de mil hectares de áreas degradadas, mas o que se está fazendo aqui vai diminuindo assoreamento e melhorando a qualidade d'água. A restauração dessas áreas é fundamental para segurar a água e nascentes que estão na emergência da seca e que impactam não só os pequenos mas grandes produtores”, afirma.
Ao se caminhar na área do lote de Silvio Domingos, agricultor do (PDS) Bordolândia, o resultado da restauração dessas áreas não deixa dúvidas. Sua área, com a extensão de 33 hectares, estava totalmente degradada. Agora, ele fez a floresta retornar aos poucos, a florescer, em uma área restaurada com sementes nativas. “Eu questionei no começo, porque essa área era muita pedra, mas me explicaram como é o processo e eu concordei, retirei as pedras grandes e fizemos. Agora, eu tô pensando em ampliar a área”, diz.
Ao todo, foram reflorestados quase seis hectares, distribuídos em 11 propriedades rurais associadas. Além disso, houve a implementação de 33 quintais produtivos que envolvem o cultivo de hortas e plantio de pomares e 13 áreas de recuperação de pastagens que estavam degradadas, que otimizaram, principalmente, o cultivo de leite das famílias de pequenos agricultores.
“É importante fazer a conectividade dessas áreas, porque elas ficam menos suscetíveis à degradação, ao fogo e dentro desses corredores ecológicos há uma probabilidade maior de efetividade da restauração e da manutenção das nascentes”, explica Aline Ferragutti, engenheira florestal do ISA que acompanhou o projeto.
No PDS Bordolândia, o projeto contou com a parceria da Associação Agroecológica Caminhos da Paz (Acampaz) e da Comissão Pastoral da Terra (CPT), que ampliaram a capacidade e eficácia da iniciativa. No início, estava previsto para este assentamento somente a aplicação do projeto em três lotes e a reforma da sede da associação. No entanto, ao final, o número quase que triplicou com a ajuda da comunidade que se articulou para fazer a extensão do projeto para mais famílias.
“Esse é o poder das sementes: faz as coisas ficarem mais vivas e bonitas e também ajuda na nossa produção, a floresta produz água limpa que vai direto para nossa horta, pastagem, mata a sede dos animais. Não vejo produção de qualidade longe das florestas. Isso foi um aprendizado desta ação”, avalia Roni Cezar, presidente da Acampaz.
Em Bordolândia, foram realizados trabalhos de restauração ecológica em 2,3 hectares, distribuídos em cinco áreas. Os resultados alcançados até o momento são animadores. Um dos destaques do PDS Bordolândia, além da restauração de Áreas de Preservação Permanente (APPs), foi a restauração das pastagens, que impactou diretamente na produção de leite de Pedro Righi, que duplicou sua produtividade leiteira.
“O projeto aqui foi muito bom para mim, fez uma diferença grande na minha venda, estou produzindo 25 litros a mais e isso eu vendo para cooperativa e ganho uma renda boa”, comemora.
A horta de Andreia Teresinha também foi beneficiada com o projeto, o que a ajudou a estabelecer renda extra com a venda de produtos semanais extraídos ali, do seu próprio quintal. Com uma produção abundante, ela consegue suprir tanto a demanda alimentar da sua casa quanto em feiras locais e se orgulha.
“Aqui no meu terreno não tem veneno e quase eu não passo no mercado para dar conta da comida, só uma coisinha ou outra para complementar. Já pensou eu passar veneno e entregar para alguém e a pessoa passar mal com o veneno? eu não”, afirma.
Plantar água é semear vida
A técnica utilizada para a restauração das áreas nos assentamentos de Mato Grosso é a "Muvuca de Sementes". Apesar do nome curioso, essa técnica de raiz ancestral vai muito além de uma simples mistura aleatória de sementes.
A muvuca é uma tradução popular da semeadura direta, que é uma técnica para restauração florestal que consiste na combinação de sementes agrícolas e florestais, incluindo sementes nativas e de adubação verde, juntamente com areia, formando um insumo que favorece, em algumas regiões, a formação da estrutura da floresta em curto tempo. Essa tecnologia otimiza os recursos disponíveis e promove a recuperação de áreas degradadas de forma eficiente e econômica.
Através da "Muvuca de Sementes", a restauração florestal ganha uma nova abordagem, combinando tradições ancestrais com inovações científicas. Essa técnica promissora tem o potencial de transformar a forma como encaramos a recuperação de áreas degradadas, permitindo a reconstrução de ecossistemas resilientes e sustentáveis.
A Rede de Sementes do Xingu (RSX), junto aos seus mais de 600 coletores beneficiados de 21 municípios, 14 assentamentos rurais, uma reserva extrativista e sete povos indígenas distribuídos em 17 aldeias desenvolve a muvuca há 16 anos na região, e de semente em semente já reflorestou mais de oito mil hectares no Brasil.
Quer conhecer melhor a Rede de Sementes?
Assista ao filme Fazedores de Floresta e se aproxime das histórias, sementes e pessoas que provaram que floresta em pé é bom pra todo mundo.
Acesse o site da Rede de Sementes do Xingu.