Acampamento, que acontece de 22 a 26 de abril, em Brasília, tem como pauta central o direito à terra
De 22 a 26 de abril, povos indígenas de todas as regiões vão ocupar Brasília (DF) nos 20 anos do Acampamento Terra Livre (ATL), maior mobilização indígena do país, coordenada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
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No centro das discussões, está a defesa do direito à terra, expressa na exigência por demarcações e pelo fim da tese anti-indígena do Marco Temporal.
Há quatro dias, o governo federal anunciou a demarcação de duas Terras Indígenas – Aldeia Velha (BA) e Cacique Fontoura (MT). No entanto, apesar das comemorações, o número de demarcações abaixo do esperado - outras quatro eram esperadas, de um total de 251 Terras Indígenas com processos ainda pendentes - gerou frustração no movimento indígena e indigenista. Em abril de 2023, no ATL, o presidente Lula anunciou a demarcação de seis áreas e chegou a prometer acabar com as pendências de reconhecimento desses territórios.
No ritmo atual, seriam necessários mais de 30 anos para concluir os processos. A demarcação das Terras Indígenas é fundamental para garantir a proteção dos povos e de seus territórios, e para conter o desmatamento e as mudanças climáticas.
A bancada ruralista pressiona para que não aconteçam mais demarcações. Um dos instrumentos usados para barrar o direito indígena à terra é a tese do Marco Temporal, derrubada no Supremo Tribunal Federal (STF), em setembro de 2023, mas que, pouco depois, tornou-se lei, após votação no Senado.
Em janeiro, o Instituto Socioambiental (ISA) entrou com um pedido de amicus curiae (amigo da corte, figura jurídica que apresenta informações e subsídios para o julgamento) na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) que contesta o Marco Temporal. No processo, o ISA sustenta que, além das inconstitucionalidades formais e materiais, a lei põe em risco as Terras e Reservas Indígenas.
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O julgamento da tese do Marco temporal no STF teve como base um processo judicial envolvendo o povo Xokleng, vítima da violência estatal desde o século XIX, na busca pela demarcação da Terra Indígena Ibirama-La Klãnõ (SC).
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Ao permitir que a demarcação das Terras Indígenas seja contestada em todas as fases do processo, inviabilizando sua conclusão, e autorizar a instalação de empreendimentos predatórios sem consulta livre, prévia e informada às comunidades, a lei ameaça os direitos indígenas em todo o país.
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Comunicadores e artistas indígenas
Neste ATL, a luta política que percorre as ruas de Brasília também vai ocupar as telas na forma de uma grande serpente, pintada em jenipapo e urucum. Na identidade visual da mobilização, a “Cobra do tempo”, ilustração produzida com o apoio do artista indígena Denilson Baniwa, do Alto Rio Negro (AM), conecta representações de uma resistência ancestral, que atravessou e sobreviveu a conjunturas políticas e governos diversos.
Relembre o começo dessa trajetória
Comunicadores indígenas devem comparecer em peso ao ATL para a cobertura colaborativa de suas associações e organizações. É o caso dos comunicadores da Rede Xingu+ e da Rede Wayuri, do Rio Negro.
Anita Juruna, comunicadora da Rede Xingu+, da Terra Indígena Paquiçamba, no Pará, diz que a “expectativa é ganhar respeito, é ganhar reconhecimento, é que as pessoas não indígenas, principalmente, vejam que estamos aqui há mais de 500 anos, que estamos aqui resistindo e lutando e vamos continuar nessa luta”.
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As histórias e memórias da resistência indígena no ATL serão transmitidas pela Rede Wayuri nas vozes de José Paulo, do povo Piratapuya, Juliana Albuquerque, do povo Baré, e João Arimar, do povo Tariano.
“Será um evento muito importante, onde terá muitas reivindicações, várias lutas… são 20 anos de luta! E por dentro de toda a história, vamos buscar nomes de pessoas que ainda existem e resistem nessa luta. Então, a minha expectativa está a mil para chegar lá e fazer essa colaboração na área da comunicação. É a primeira vez que eu estou indo, estou muito ansioso para conhecer de perto esse grande movimento, em que vamos estar fazendo uma transmissão ao vivo da nossa rádio online”, compartilha José Paulo.
A programação completa para os para os próximos dias está disponível no site da APIB e no instagram da @coiabamazonia. Confira alguns destaques:
Plenárias do ATL
Distribuídas em cinco dias de atividades, as plenárias do ATL 2024 abordarão algumas temáticas como saúde mental, emergência climática, educação escolar indígena, comunicação indígena e políticas afirmativas.
Na sexta-feira (26/04), a plenária do ATL também dará lugar à discussão sobre a reparação histórica e não repetição dos crimes cometidos pela ditadura militar contra os povos indígenas.
Exibição do Filme “Amazônia, a nova Minamata?”
Documentário acompanha a luta do povo Munduruku para conter o avanço do garimpo ilegal em seu território ancestral, enquanto revela como a doença de Minamata, decorrente da contaminação por mercúrio, ameaça os habitantes da Amazônia. Exibição acontece na segunda-feira (22/04), às 20h, na tenda da Coiab.
Mapeamento das Organizações de Mulheres Indígenas no Brasil
Parceria entre o ISA e a Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga), a checagem e validação coletiva dos dados referentes à 2ª edição do Mapa das Organizações de Mulheres Indígenas no Brasil acontece na terça-feira (23/4), às 16h, na tenda da Anmiga.
A ação visa dar continuidade à primeira edição do Mapa, de 2020, que registrou 92 organizações de mulheres indígenas em 21 Estados brasileiros.
Marchas do ATL
Previstas para terça-feira (23/04) às 9h e quinta-feira (25/04) às 15h, respectivamente, as marchas “#EmergênciaIndígena: Nossos Direitos não se negociam” e “Nosso marco é ancestral. Sempre estivemos aqui!” conduzirão milhares de pessoas pelas ruas de Brasília (DF), entre indígenas, membros de organizações do terceiro setor e apoiadores da causa socioambiental.
Ato em homenagem a Nega Pataxó
Em janeiro, a pajé Nega Pataxó, do povo Pataxó Hã-Hã-Hã, foi assassinada durante um conflito com a polícia militar e fazendeiros do grupo autointitulado “invasão zero”, na retomada do território Caramuru, em Potiraguá (BA).
A liderança foi mais uma das inúmeras vítimas da violência contra os povos indígenas, que tende a se intensificar com a aprovação do PL do Marco Temporal. Por isso, a homenagem a Nega Pataxó é também um ato de resistência e defesa do futuro dos povos originários.