Anúncios de políticas na COP30 reconhecem povos da Terra do Meio (PA) como guardiões da floresta
Governo autorizou, em evento na AgriZone, valor de R$ 2,6 milhões para o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) na região. Parceria entre o Governo do Pará e o BID prevê investimentos de US$ 3,5 milhões em projeto de Pagamento por Serviços Ambientais
Povos indígenas, beiradeiros e agroextrativistas que convivem na Terra do Meio (PA) têm um papel essencial no manejo e cuidado dessa região, que forma um mosaico de Áreas Protegidas ao redor dos Rios Xingu e Iriri, no Pará. Representantes da Rede Terra do Meio, que reúne associações desses povos, participaram da COP30, em Belém, e vão retornar para casa com o anúncio de duas políticas públicas que promovem seus modos de vida e geram renda.
Na segunda-feira (17/11), o Governo Federal anunciou R$2,6 milhões para o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) na região, sendo R$1,8 milhão da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e R$800 mil do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS). A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) é responsável pelo plano operacional e tem a parceria, além da Funai e do MDS, do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA).
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Ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), Paulo Teixeira, durante anúncio do PAA para a Terra do Meio|Leonardo de Moura/ISA
A assinatura ocorreu na AgriZone, espaço da Embrapa na COP30, e contou com ampla representação dos povos da Terra do Meio e com a presença do ministro do MDA, Paulo Teixeira, e da presidenta da Funai, Joênia Wapichana, entre outras autoridades.
Diretor de Política Agrícola e Informações da Conab, Silvio Porto ressaltou a inovação do projeto e a participação da Funai. Segundo Joênia Wapichana, o acordo reafirma a identidade cultural indígena e pode ser replicado em outros territórios. “Essa é uma medida, uma política pública, que pode e deve ser replicada em outros territórios indígenas do país e mostra que a Terra Indígena tem sua importância neste cenário de segurança alimentar”, destacou a presidenta da Funai.
O PAA na Terra do Meio já vinha se destacando pela diversidade de povos e alimentos. Entre novembro de 2023 e julho de 2025, o programa chegou a 11 territórios, com a participação de 537 pessoas, sendo 63% mulheres. No total, foram entregues 150.000 kg de alimentos de 76 tipos, com 61 escolas recebendo os produtos.
Assista ao vídeo sobre o PAA na Terra do Meio.
Com o programa, o alimento das roças tradicionais, florestas e rios são entregues nas escolas e outras instituições. Para que isso seja possível, vem sendo realizada uma série de adequações nas políticas públicas, de forma a desburocratizar e flexibilizar processos.
A Comissão de Alimentos Tradicionais dos Povos (Catrapovos), encabeçada pelo Ministério Público Federal e com participação da sociedade civil, tem papel essencial na indicação de adequações das políticas de aquisição de alimentos à realidade dos territórios.
Pagamento por Serviços Ambientais (PSA)
Na semana anterior, no dia 12 de novembro, o diretor-presidente da Rede Terra do Meio, Francisco de Assis Porto, participou de cerimônia ao lado do governador do Estado do Pará, Helder Barbalho, e da representante do BID no Brasil, Annette Kilmer.
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Governador do Pará, Helder Barbalho, a representante do BID no Brasil, Annette Kilmer, e o diretor-presidente da Rede Terra do Meio, Francisco de Assis Porto|Ana Amélia Hamdan/ISA
O encontro foi para a assinatura do contrato de projeto-piloto de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) na região da Terra do Meio, que prevê investimentos de US$3,5 milhões. A assinatura ocorreu na Zona Azul, espaço da COP30 onde as delegações negociam acordos climáticos.
“Esse é o primeiro passo para acessarmos um direito que é nosso, que somos os guardiões da floresta. E a organização, a gestão e a visibilidade da Rede Terra do Meio sensibilizaram o Estado. A gente se sente feliz e bem por preservar a floresta”, comemorou.
A construção do projeto será em conjunto com os povos da Terra do Meio. O próximo passo é a implementação do plano de engajamento, consulta e mobilização para a elaboração do projeto-piloto.
O convênio envolve o Governo do Pará, o BID e o Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio). O objetivo é reconhecer o papel dessas populações na preservação da floresta e fomentar modelos sustentáveis de desenvolvimento nos territórios coletivos.
Cerca de 40% dos recursos serão utilizados diretamente nos pagamentos, orientando a construção de uma política pública permanente de PSA no Pará.
Tanto o PAA e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e o PSA têm se mostrado políticas públicas eficazes de segurança alimentar, mas também de proteção ambiental e regulação climática. Quando adequadas às realidades dos territórios, o PAA e o PNAE promovem os sistemas agrícolas tradicionais de indígenas, quilombolas e povos e comunidades tradicionais, que produzem alimentos e, ao mesmo tempo, promovem o cuidado com a floresta. Já a política de Pagamento por Serviço Ambiental (PSA) reconhece e potencializa o papel dessas populações na preservação.
(Com informações da Agência Brasil de Comunicação)
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Com estreia na COP30, filme 'Vidas Beiradeiras' revela rostos e práticas de comunidades da Terra do Meio (PA)
Documentário retrata modo de vida único na Bacia do Rio Xingu, desenvolvido a partir de inspiração sertaneja e indígena após migração do ciclo da borracha
O som de um motor de barco dá início ao documentário “Vidas Beiradeiras - Saberes e Práticas Tradicionais na Floresta”. É para uma viagem até a Terra do Meio, no Baixo e Médio Rio Xingu, no Pará, que o filme nos leva.
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Modos de vida entrelaçados aos cursos d'água estão no documentário Vidas Beiradeiras. Na foto, embarcação na Resex do Rio Iriri|Lilo Clareto/ISA
Essa região da Amazônia guarda números grandiosos: com extensão de aproximadamente nove milhões de hectares em meio aos Rios Xingu e Iriri, abriga três Reservas Extrativistas - Resex Xingu, Resex Riozinho do Anfrísio e Resex do Iriri - a Estação Ecológica Terra do Meio, o Parque Nacional da Serra do Pardo e 10 Terras Indígenas.
Mas ganha um novo contorno quando chegamos mais perto e entramos na floresta para conhecer os rostos, os nomes e as histórias da gente beiradeira que vive nesse interflúvio de rios.
“O pessoal, no começo, queria valorizar a floresta, mas esquecia do povo. Mas eu sempre falo que não existe floresta sem o povo”, diz Raimunda Rodrigues, da Resex Rio Iriri.
O documentário registra um modo de vida singular que beiradeiros e beiradeiras da Terra do Meio desenvolveram a partir de matrizes indígenas e sertanejas. O lançamento será em 15 de novembro, na COP30, em Belém, no Pavilhão Food Roots and Routes Pavilion, a partir das 16h.
A realização da COP 30 em Belém, no Pará, é também uma oportunidade de se debater sobre o tema e impulsionar o reconhecimento desses sistemas. A atividade econômica praticada por esses povos é integrada à floresta e considera os tempos e espaços necessários para essa coexistência, produzindo fartura e preservando o ambiente ao mesmo tempo, promovendo biodiversidade, cuidado com a água e regulação climática.
Em tempos de emergência climática, são sistemas que devem ser olhados e reconhecidos como alternativa a atividades predatórias.
A narração que nos guia pelos rios, roças e floresta é de Liliane Ferreira, beiradeira da Resex do Rio Iriri e dona do sorriso que está nas primeiras cenas. Ela conta sobre o SAT Beiradeiro, o Sistema Agrícola Tradicional dos beiradeiros. Um sistema que inclui a roça e se expande para seringais, castanhais, casas, pesca, caça, práticas de cura e festejos.
“Boa tarde, esse aqui é o nosso SAT, nosso sistema agrícola tradicional. (...) Então, começando, chega pelo rio, continua com as casas das famílias. Aí temos aqui como tirar a seringa. Temos aqui uma rocinha com várias diversidades de planta: macaxeira, mandioca, milho, arroz , feijão. Que a gente precisa pra tirar o alimento pra gente poder trabalhar nas outras coisas. Pra tirar a seringa a gente precisa ter alimentação. Pra tirar a castanha, pra furar a copaíba, coletar andiroba também”, explica.
Além de navegar pelos Rios Xingu e Iriri e acompanhar o trabalho na roça, o filme mostra a coleta das castanhas em meio à floresta e todo o processo realizado até a comercialização: o ouriço que cai no chão da mata, a retirada da amêndoa, a lavagem, o transporte em canoa.
Retrata também como aproveitar o babaçu - do mingau ao carvão. E ainda conta das casas e das canoas, construídas com o que a floresta oferta.
Nas imagens, também aparecem os saberes dos seringueiros: da abertura das estradas da seringa, passando sobre como deve ser o corte no tronco da árvore, até os segredos para não se perder em meio à mata.
A seringa é o motivo de boa parte dessas pessoas estar ali. Os chamados beiradeiros chegaram do Nordeste para essa região incentivados pelo governo federal, por conta dos dois grandes ciclos da borracha que aqueceram a economia brasileira entre o final do século XIX e início do século XX.
Na região já estavam - desde tempo imemoriais - povos indígenas, entre eles os Xipaya, Yudjá/Juruna, Arara, Kuruaya, Araweté, Asurini e Parakanã. Esse encontro, com relações construídas ao longo do tempo, resultou num modo de vida próprio, ainda pouco conhecido.
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Trilha do castanhal na Reserva Extrativista Riozinho do Anfrísio, Terra do Meio (PA)|Rogério Assis/ISA
Com o declínio desse ciclo econômico, a população beiradeira foi invisibilizada. E vem sofrendo com pressões constantes de projetos do agronegócio, exploração madeireira, garimpo, expansão de cidades e, mais recentemente, o da Usina de Belo Monte.
Ao mostrar o modo de vida dos beiradeiros e beiradeiras, o filme reforça a importância dessas pessoas e fortalece a necessidade de reconhecimento do Sistema Agrícola Tradicional Beiradeiro - o SAT Beiradeiro - como patrimônio pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO, na sigla em inglês).
No país, há dois sistemas agrícolas já reconhecidos pelo Iphan: o SAT Rio Negro, dos povos indígenas do Rio Negro (AM) e do SAT Q, o Sistema Agrícola Tradicinal das Comunidades Quilombolas do Vale do Ribeira (SP). No país, a FAO reconhece como patrimônio agrícola mundial o Sistema de Apanhadores de Flores Sempre-Vivas, em Minas Gerais; e o Sistema Agroflorestal Tradicional de Cultivo da Erva-Mate, no Paraná.
O filme foi exibido em dezembro de 2024 no XI Encontro Terra do Meio, em Altamira (PA), tendo como público os beiradeiros e as beiradeiras, com roda de conversa conduzida pelo antropólogo Augusto Postigo. Ele dirige o filme ao lado de Tatiane Vesch. A co-direção é de Tainá Aragão.
“Mostrar essas vidas e histórias, além desses modos de vida, reforça a importância dessas pessoas que estão sendo invisibilizadas. Os beiradeiros e beiradeiras mantêm sistemas agrícolas e culturais sofisticados, capazes de promover equilíbrio entre sustento e floresta”, diz Augusto Postigo.
Na introdução do livro, André Villas-Bôas, co-fundador e membro do Conselho Diretor do ISA, escreve sobre o modo de vida beiradeiro: “A estratégia de adaptação às condições adversas de existência resultaram num modo de vida próprio, ainda hoje muito pouco conhecido e valorizado e que merece ser abordado como um patrimônio cultural particular”.
Durante o filme, Genival Aguiar, da Resex Riozinho do Anfrísio, que é filmado sentado em sua canoa, resume o que, para ele, é ser um beiradeiro. “E eu sinto assim, que a gente é a raiz da floresta. Estamos com ela firmes, seguros. Se nós não cuidarmos, ela cai.”
Para Marta Gomes da Silva, da mesma Resex, esse cuidado é o legado dos beiradeiros. “Além de a gente preservar, a gente vai deixar um legado para as crianças e para nossos filhos e netos, sobrinhos também, e que mais na frente, eles vão saber como também é bom preservar a floresta.”
Se esse território e esse modo de vida têm preço? Quem responde é seu Francisco Neves de Souza, da Resex Rio Iriri: “Daqui eu tiro a farinha, eu tiro a macaxeira, eu tiro o cará, eu tiro a banana, eu tiro alimentação para os meus filhos, para a minha família, pra sempre", pontua
"E se eu vender essa terra para vocês por R$1 milhão, eu ainda estou fazendo um negócio que não é nem bom pra mim, nem pro meu filho, para a minha família, entendeu?”.
Lançamento do “Vidas Beiradeiras - Saberes e Práticas Tradicionais na Floresta” na COP30, Belém (PA) Data: 15/11 às 16h Local: Food Roots and Routes Pavilion, Zona Azul
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Rede Terra do Meio leva as economias da floresta à COP30
Coletivo da Terra do Meio (PA) também deve cobrar financiamento e políticas públicas adequadas aos territórios
“A Rede Terra do Meio somos nós, beiradeiros, indígenas e agricultores familiares. Somos mais de 35 organizações, nove territórios indígenas, três reservas extrativistas e, ainda, comunidades agroextrativistas cuidando de cerca de nove milhões de hectares de área protegida.”
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A Rede Terra do Meio reúne 35 organizações e leva para a COP30 a biodiversidade que eles ajudam fortalecer|Lilo Clareto/ISA
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As economias da sociobiodiversidade na Terra do Meio inspiram o futuro e salvaguardam a floresta |Juliana Oliveira/ISA
Essa fala da comunicadora Marta Gomes faz parte do minidocumentário “Rede Terra do Meio - Economias dos povos protegem a floresta e inspiram o futuro”, que retrata a aliança dos povos que atuam na região da Terra do Meio (PA), promovendo os modos de vida e as economias da sociobiodiversidade. São as economias dos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, que produzem fartura de alimentos, geram renda e, ao mesmo tempo, protegem a floresta, promovendo a biodiversidade, o cuidado com a água e a regulação climática.
E a Rede Terra do Meio levará essa potência até a COP30, com seus integrantes participando de mesas e debates, mostrando a comercialização de produtos como a castanha, a borracha e o babaçu, mas também ampliando diálogos sobre políticas públicas adequadas aos territórios e mecanismos de financiamento que possam cuidar e fortalecer os guardiões da floresta.
No domingo (09/11), o diretor-presidente da Rede Terra do Meio, Francisco de Assis Porto, e a comunicadora Marta Gomes, participaram da mesa “Sociobioeconomia Revelada”, no Museu Emílio Goeldi, em Belém.
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O diretor-presidente da Rede Terra do Meio, Francisco de Assis Porto, esteve presente à mesa sobre arqueologias e conhecimentos ancestrais, em Belém|Juliana Oliveira/ISA
O encontro trouxe para o debate o que a arqueologia e os conhecimentos ancestrais revelam sobre a contribuição das economias de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais para a formação das paisagens e regulação climática. Também participaram da conversa o arqueólogo Eduardo Neves e o diretor da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN), Hélio Lopes.
Na quarta-feira (12/11), na AgriZone, espaço da Embrapa na COP30, é a vez de Liliane Santos, do Coletivo Olhos do Xingu, representar a Rede Terra do Meio na mesa “Clima, comida e saberes - Estratégias e políticas que salvaguardam Sistemas Agrícolas Tradicionais, promovem soberania alimentar e contribuem para o equilíbrio climático”.
O diretor-presidente da Rede Terra do Meio, Assis Porto, considera que a COP30 é um espaço muito importante para mostrar a força da economia dos povos da floresta. Mas, também, para buscar o reconhecimento dos serviços que vêm sendo prestados por esses povos milenarmente, com sistemas de produção e manejo que convivem com o meio ambiente.
Dessa forma, as discussões envolveram a necessidade de políticas públicas adequadas aos territórios. Um dos exemplos vem da Política de Aquisição de Alimentos (PAA), que após adequações, vem se mostrando eficaz na promoção das roças tradicionais, levando à proteção do meio ambiente.
Entre novembro de 2023 e julho de 2025, as entregas do PAA pela Rede Terra do Meio envolveram 11 territórios e 537 fornecedores, sendo 63% mulheres. Foram entregues 150 mil kg de alimentos de 76 tipos. O número de escolas atendidas chegou a 61.
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10° Semana do Extrativismo (Semex), que ocorreu em maio, reuniu indígenas, agricultores familiares, representantes de órgãos públicos e outros parceiros|Juliana Oliveira/ISA
A Rede Terra do Meio também vem desenvolvendo um piloto de Pagamento por Serviço Ambiental (PSA), em parceria com o Governo do Pará. E criou o Fundo Terra do Meio para captação de recursos e decisões coletivas sobre investimentos.
Os resultados desse manejo e das ações da Rede aparecem nos números. Em 2009, a Rede Terra do Meio movimentava anualmente R$8,5 mil e trabalhava com apenas três produtos. Em 2024, esses números passaram para R$2,1 milhões e pelo menos 86 produtos.
Para o analista sênior em economia da sociobiodiversidade do Instituto Socioambiental (ISA) e membro da secretaria executiva da Rede Terra do Meio, Jeferson Camarão Straatmann, para além da comercialização, a Rede Terra do Meio mostra que é possível promover uma economia da diversidade e do envolvimento.
“É uma economia que fortalece os laços entre os povos. A região da Terra do Meio é um arranjo de povos indígenas, comunidades tradicionais, ribeirinhos, beiradeiros e agricultores familiares, que tem como objetivo primeiro agregar as pessoas em função dos seus sistemas agrícolas tradicionais e seus sistemas de conhecimento. Por meio da comercialização desses produtos, potencializa-se a continuidade desses saberes, de uma geração para outra, transformando florestas em florestas, promovendo a proteção da água, cuidado da biodiversidade e regulação climática”, diz.
Ao final do documentário, a liderança indígena Ney Xipaya resume o principal motivo do fortalecimento das economias da sociobiodiversidade. “Vou permanecer dentro do meu território, junto com a minha família, com meus ancestrais, e manter o legado que é do meu patrimônio cultural, que é a minha história, a minha identidade.”
Mesa “Clima, comida e saberes - Estratégias e políticas que salvaguardam Sistemas Agrícolas Tradicionais, promovem soberania alimentar e contribuem para o equilíbrio climático”, com Liliane Santos, do Coletivo Olhos do Xingu, representando a Rede Terra do Meio Quarta-feira (12/11), das 11h20 às 13h55 Agrizone da Embrapa - Belém - Auditório A3
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Ouça! Podcast 'Floresta no Centro' apresenta como mudanças climáticas afetam a arte das ceramistas do Xingu
Em terceiro episódio da série, Yakuwipu Waurá, liderança, professora e ceramista, debate com Karina Araujo, do ISA, temas como espiritualidade, cuidado e ancestralidade
O Instituto Socioambiental (ISA) lança o terceiro episódio do podcast “Floresta no Centro”. Desta vez, a liderança, ceramista e professora Yakuwipu Waurá, conversa com Karina Araujo, analista de desenvolvimento de pesquisa social do ISA, sobre a tradição do fazer peças em cerâmicas no Território Indígena no Xingu.
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A liderança, ceramista e professora Yakuwipu Waurá participou do evento "COP30: Mudanças climáticas e o impacto da identidade Xinguana", no ISA|Brenda Okubo/ISA
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O episódio, que foi gravado no espaço Floresta no Centro, atravessa também temas como espiritualidade, cuidado e ancestralidade|Brenda Okubo/ISA
Com o tema “COP30: Mudanças climáticas e o impacto da identidade Xinguana”, elas abordam como as mudanças climáticas tornam indisponível uma matéria-prima central para a produção das peças, o cauxi, uma esponja retirada do fundo dos rios que é essencial para dar liga ao barro e evitar rachaduras nas peças.
As secas prolongadas e as cheias cada vez mais curtas e irregulares reduziram drasticamente a presença do cauxi. O episódio atravessa também temas como espiritualidade, cuidado e ancestralidade.
Durante a passagem por São Paulo, as ceramistas xinguanas participaram de oficinas no Museu das Culturas Indígenas, no Museu A Casa do Objeto Brasileiro e no Sesc Consolação.
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Da esquerda para a direita: Yakuwipu Waura; Pere Yalaki Waura; Kayana Pisulu Waura; Kutalo Waura; todas da aldeia Piulewene; e Kuheju Waura, da aldeia Ulupuwe; em visita ao Museu das Culturas Indígenas|Claudio Tavares/ISA
Gravado durante os eventos realizados no Espaço Floresta do Centro (https://loja.socioambiental.org/), em São Paulo, o podcast é uma realização do ISA e faz parte de um esforço coletivo para amplificar vozes originárias e de povos e comunidades tradicionais.
O podcast Floresta no Centro tem apoio da Fundação Rainforest da Noruega.
Ouça agora
Créditos Identidade visual: Cama Leão Captação de áudio, identidade sonora e edição: Voz Ativa Produções
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Amazônia pode perder 2,9 bi t de carbono até 2030 sem proteção de Terras Indígenas e Áreas Protegidas
Cientistas da RAISG apontam, rumo à COP30, que a proteção das florestas mais preservadas da Amazônia é decisiva para conter o aquecimento global
Os povos indígenas têm se mostrado os melhores guardiões da Amazônia. Graças aos seus conhecimentos ancestrais e à gestão sustentável, as Terras Indígenas e Áreas Naturais Protegidas abrigam as florestas mais conservadas e com menores taxas de desmatamento. Além disso, concentram 61% do carbono florestal capturado em 2023 em toda a Amazônia, ajudando a reduzir o excesso de CO₂ na atmosfera e a mitigar o aquecimento global, segundo a Rede Amazônica de Informação Socioambiental Georreferenciada (RAISG), da qual o Instituto Socioambiental (ISA) e outras sete organizações fazem parte.
Se nos próximos cinco anos os governos amazônicos aplicarem pouco ou nenhum controle sobre o desmatamento, sobretudo em Áreas Protegidas, a Amazônia deixará de capturar 2,94 bilhões de toneladas de carbono em 2030.
É o que revela o levantamento inédito do projeto Ciência e Saber Indígena pela Amazônia, da RAISG e do Woodwell Climate Research Center, que projeta três cenários futuros para as reservas de carbono: “Cenário 1: ausência de Terras Indígenas e Áreas Naturais Protegidas” (*) – descrito acima –, “Cenário 2: regulação permissiva” e “Cenário 3: inação”.
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Área desmatada para a plantação de soja no Território Indígena do Xingu, no estado de Mato Grosso|Fábio Nascimento/ISA
Para isso, os cientistas utilizaram a ferramenta de simulação Dinâmica Ego e dados atuais de monitoramento por satélite, com o objetivo de orientar melhores políticas públicas, às vésperas da COP30, em novembro, no Brasil.
No Cenário 1: a Amazônia passaria de capturar mais de 85 bilhões de toneladas de carbono em 2023, para capturar apenas 82,257 bilhões em 2030, representando uma redução de 3,5%. Isso ocorreria caso os governos aplicassem pouco ou nenhum controle sobre o desmatamento, permitindo o avanço descontrolado de atividades como agricultura, pecuária, infraestrutura e mineração, que destroem e degradam as florestas, principalmente em TIs e ANPs.
"Cada tonelada de carbono que conseguimos manter nas florestas amazônicas é um investimento no futuro do planeta. Fortalecer a proteção das Terras Indígenas e das Áreas Protegidas significa conservar as maiores reservas de carbono florestal do mundo, um pilar indispensável para cumprir os compromissos climáticos globais”, lembra Mireya Bravo Frey, coordenadora regional do Projeto Ciência e Saber Indígena pela Amazônia.
Mas o que é a captura de carbono florestal e qual sua importância no contexto atual? Durante a fotossíntese, árvores e vegetação capturam carbono, um elemento do dióxido de carbono (CO₂) presente na atmosfera, e o retêm em raízes, troncos e folhas. Dessa forma, ajudam a controlar este gás de efeito estufa, produzido em excesso principalmente pelo uso de combustíveis fósseis e pelo desmatamento causado por atividades econômicas, como a pecuária.
Por isso, sua função é vital em um contexto no qual, apesar do Acordo de Paris – que estabelece manter o aumento da temperatura abaixo de 2 °C – já ultrapassamos 1,5 °C e os efeitos do aquecimento global se agravam.
“Ter menos florestas é ter menos reservas de carbono na Amazônia, o que significa mais emissões poluentes para o mundo. Isso gera temperaturas mais altas no planeta e eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes, como secas, inundações, florestas mais suscetíveis a incêndios e chuvas mais imprevisíveis. Um cenário que compromete não apenas a biodiversidade e a cultura amazônica, mas também a segurança hídrica e alimentar do planeta”, alerta Jose Victorio, especialista em Sistemas de Informação Geográfica e Sensoriamento Remoto da RAISG.
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Queimadas na floresta amazônica em agosto de 2019, Candeias do Jamari, no estado de Rondônia|Victor Moriyama / Greenpeace
Políticas fracas e sem mudanças
O Cenário 2: regulação permissiva, ocorreria se os países amazônicos aplicassem políticas ambientais e marcos legais mais fracos nos próximos cinco anos. Isso geraria picos máximos na mudança do uso do solo, transformando grandes áreas de florestas amazônicas em terras agropecuárias, urbanas e mineradoras.
Nesse caso, a Amazônia deixaria de capturar 2,294 bilhões de toneladas de carbono em 2030, em relação a 2023, devido ao avanço do desmatamento e da degradação florestal. Ou seja, as florestas passariam, de capturar mais de 85 bilhões de toneladas em 2023, para armazenar apenas 82,904 bilhões em 2030, representando uma redução de 2,7% nessas importantes reservas.
Por fim, no Cenário 3: inação, em que os governos não promovem mudanças significativas nas políticas ambientais e as atuais taxas de desmatamento se mantêm, a Amazônia deixaria de capturar 1,113 bilhões de toneladas de carbono até 2030, em relação a 2023 — ou seja, 2% a menos.
O panorama de 2023
Segundo a RAISG, nas últimas décadas a Amazônia já teve suas funções de combate às mudanças climáticas enfraquecidas. Em 2023, suas florestas deixaram de capturar 5,7 bilhões de toneladas de carbono, em comparação ao ano 2000, o que representou uma redução de 6,3%.
De acordo com dados do MapBiomas Amazônia – Uso e Cobertura, da RAISG, entre 1985 e 2023, mais de 88 milhões de hectares de florestas que regulavam o clima global foram transformadas em terras agropecuárias, urbanas e mineradoras.
Além disso, essas atividades fragmentaram as florestas e causaram um dano silencioso às árvores remanescentes, afetando sua mortalidade, capacidade de regeneração e processos de fotossíntese, fundamentais para a captura de carbono.
Como evitar os piores cenários?
Para evitar os piores cenários futuros, a RAISG faz um chamado aos tomadores de decisão. Antes de 2030, é urgente implementar estratégias que eliminem o desmatamento, a degradação e os incêndios florestais, dentro e fora das Terras Indígenas e Áreas Naturais Protegidas. Além disso, é essencial fortalecer o papel dos povos indígenas como guardiões das florestas, garantindo seus direitos humanos e territoriais.
“Estamos diante de uma contagem regressiva ambiental: se não forem fortalecidas as políticas de proteção e não for reconhecido o papel central dos povos indígenas e das comunidades locais, a Amazônia deixará de ser um aliado climático e se tornará uma fonte de crise. Não se trata apenas de árvores; trata-se da vida no planeta”, afirma Renzo Piana, diretor executivo do Instituto do Bem Comum, membro da RAISG.
Nesse sentido, recomenda-se priorizar políticas que articulem ciência e saberes dos povos amazônicos, para desenvolver modelos econômicos e tecnologias baseados em baixas emissões de CO₂ e usos sustentáveis de florestas e sistemas hídricos. Também é necessário conter o desmatamento, os incêndios e o avanço de atividades ilegais e crimes ambientais, que ameaçam a conservação dos ecossistemas e o bem-estar dos habitantes da Amazônia.
Do mesmo modo, recomenda-se preencher lacunas de proteção criando corredores entre Terras Indígenas, territórios coletivos comunitários, Áreas Naturais Protegidas e outras Unidades de Conservação, dos Andes à Amazônia, por meio de articulação, titulação de terras e fortalecimento da gestão dos povos indígenas.
"A Amazônia ainda pode ser nosso melhor aliado climático se agirmos com urgência. Reconhecer o papel dos povos indígenas e fortalecer a proteção de seus territórios é fundamental para garantir água, alimentos e estabilidade climática. Não se trata apenas de conservar uma floresta: trata-se de assegurar a vida e o futuro de todos", conclui Mireya Bravo Frey.
(*) “Ausência de Terras Indígenas e Áreas Naturais Protegidas” refere-se a unidades territoriais com foco em sustentabilidade socioambiental ou conservação.
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Organizações indígenas e indigenistas alertam para urgência de retirar invasores da Terra Indígena Cachoeira Seca, no Pará
Com regularização fundiária pendente há quase uma década, o território do povo Arara, de recente contato, é alvo de invasões e desmatamento e vive uma emergência em saúde
Em nota técnica divulgada hoje (17/10), organizações indígenas e indigenistas alertam para a situação precária dos indígenas Arara que vivem na Terra Indígena Cachoeira Seca, na região do médio Xingu, no Pará. Entre 2023 e 2024, o desmatamento na TI Cachoeira Seca saltou de 795 hectares (ha) para 1.149 ha, um crescimento de 45%. Este aumento contrasta drasticamente com a tendência regional: a bacia do Xingu reduziu o desmatamento em 46%, e a Amazônia Legal em 30,6%. Segundo dados do sistema de monitoramento Sirad X, do Instituto Socioambiental (Isa), a Cachoeira Seca figura entre as poucas TIs do país onde a destruição avançou, ocupando o 4º lugar no ranking geral da Amazônia.
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Cachoeira Seca figura entre as poucas TIs do país onde a destruição avançou. Na imagem, área desmatada no território|Juan Doblas/ISA
O documento apresenta uma análise sobre a urgência de avançar na regularização fundiária do território, destacando o crescimento do desmatamento na área, que contrasta com a redução observada em outras TIs da bacia do Xingu. Enquanto a Amazônia Legal e a bacia do Xingu celebram quedas históricas no desmatamento, os índices no território Arara seguiram uma tendência inversa, de aumento da devastação. O documento expõe a presença de invasores e o desmatamento como causas de uma crise que combina insegurança territorial e uma emergência de saúde psicossocial entre os indígenas.
Regularização atrasada impulsiona invasões
Esforços governamentais recentes resultaram na desintrusão de outras TIs importantes na região, como a Apyterewa, Trincheira-Bacajá e Ituna Itatá, ações que reduziram drasticamente o desmatamento nessas áreas. Contudo, o mesmo empenho ainda não ocorreu na Cachoeira Seca. O território não está incluído na lista de desintrusões da ADPF 709 (Arguição por Descumprimento de Preceito Fundamental) e não há previsão do Ministério da Justiça, do Ministério dos Povos Indígenas ou da Funai para que a regularização seja concluída. A demora na regularização estimula novos invasores e a insegurança territorial agrava o sofrimento dos Arara.
A situação se agravou com a construção da hidrelétrica de Belo Monte, que deveria ter sido precedida de ações de regularização fundiária e proteção territorial que até hoje, 13 anos depois da licença de instalação, não foram concluídas. As condicionantes descumpridas são justamente aquelas que foram desenhadas para impedir as invasões e o desmatamento nas terras indígenas afetadas pela obra.
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A estrada que liga Uruará ao porto Maribel é muito utilizada para escoamento de madeira retirada ilegalmente, especialmente da TI Cachoeira Seca do Iriri|Lilo Clareto/ISA
O legado do contato forçado
A vulnerabilidade da TI Cachoeira Seca é uma dívida histórica. O povo Arara (que se autodenomina Ugoro’gmó) teve contato mais constante com a sociedade envolvente em 1987, após uma dramática resistência à construção da rodovia Transamazônica (BR-230), que cortou seu território tradicional.
Décadas após a BR-230, uma nova obra federal, a hidrelétrica de Belo Monte, voltou a desestabilizar a segurança territorial precária. A conclusão da regularização fundiária de todas as TIs impactadas era uma condicionante para o licenciamento da usina, mas na Cachoeira Seca, o processo legal para a retirada dos ocupantes sequer foi iniciado. A omissão do Estado permitiu que novos invasores continuassem a entrar no território.
O desmatamento acumulado na TI ultrapassou 68.777 hectares até julho de 2025, representando 9,35% da área total. A invasão se dá pela abertura de ramais ilegais para roubo de madeira. Desde 2018, o monitoramento da Rede Xingu+ já mapeou 586 quilômetros de ramais, com a principal aldeia (Iriri) agora a menos de 30 km da área invadida. A alta ocorrência de fogo também é uma ameaça: a área queimada quase dobrou em 2023 (11.625 ha) em comparação com 2022, reflexo da ocupação para criação de gado e consolidação de áreas desmatadas.
Emergência em saúde mental
A lentidão em resolver as questões fundiárias e os profundos impactos de Belo Monte têm provocado sofrimentos intensos e agudos no povo Arara. Profissionais classificam a situação como uma verdadeira emergência em saúde mental. Uma carta da Rede Bem Viver da Cachoeira Seca relatou adoecimentos e sofrimento psíquico que alimentam um ciclo de mortes em circunstâncias dolorosas. Em 2023 e 2025, foram registrados falecimentos de lideranças e jovens em episódios associados ao consumo de álcool. Apesar da gravidade, a concessionária de Belo Monte tem negado apoio à saúde, repetindo a frase: “não vemos nexo de causalidade” entre as carências dos Arara e o empreendimento.
Ameaças futuras e recomendações urgentes
O cenário já tenso pode se agravar com a iminente pavimentação do trecho Medicilândia-Rurópolis da BR-230. Segundo os estudos de impacto, essa obra valorizará os terrenos e potencializará a ocupação ilegal, intensificando os conflitos na área, uma vez que estradas vicinais já penetram a TI Cachoeira Seca. A TI é considerada estratégica por representar o limite Noroeste do corredor ecológico de áreas protegidas do Xingu, absorvendo as pressões vindas da Transamazônica.
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Entorno da rodovia Transamazônica, próximo à hidrelétrica de Belo Monte|Lilo Clareto/ISA
As organizações que assinam a nota técnica - Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Observatório dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (Opi), Instituto Socioambiental (Isa), Conectas e Conselho Indigenista Missionário (Cimi) - fazem uma série de recomendações para fortalecer a segurança da TI Cachoeira Seca.
Entre elas, destacam-se:
• Apresentação imediata de um cronograma de finalização da desintrusão da TI Cachoeira Seca pela Funai. • Definição de ações emergenciais pela Polícia Federal, IBAMA e Funai para impedir a extração ilegal de madeira e o avanço dos ramais. • Que o início das obras de pavimentação da BR-230 seja condicionado à conclusão do processo de regularização fundiária da TI. • A investigação pelo Ministério Público Federal (MPF) das atuais grilagens e invasões.
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Canoada Xingu chega à sétima edição e convida turistas a remar pelos desafios da Amazônia
Liderada pelo povo Juruna/Yudjá, a Canoada Xingu é uma expedição de 110km a remo pela Volta Grande do Xingu e acontece entre os dias 22 e 27 de novembro
A Canoada Xingu é uma experiência única de imersão na Amazônia, um mergulho profundo na natureza, na cultura e na realidade socioambiental de uma das regiões mais emblemáticas e ameaçadas da Amazônia, em um ano crucial para o futuro do Brasil e do planeta.
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Canoada Xingu reforça o vínculo histórico e cultural com o rio e a identidade Juruna/Yudjá, e promove o turismo comunitário|Marcelo Soubhia/ISA
A expedição é liderada pelo povo Juruna/Yudjá, canoeiros ancestrais do Xingu, em parceria com o Instituto Socioambiental (ISA) e a Mazô Maná, com apoio do Fundo Amazônia e da Amazon Watch.
A primeira edição da Canoada aconteceu em 2014 como ato de defesa do Rio Xingu que passou a ser ameaçado pela construção e operação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Foi também um ato de resistência para chamar a atenção do mundo para os impactos de Belo Monte sobre rios, florestas e o modo de vida dos povos da Volta Grande do Xingu.
Hoje, a Canoada Xingu reforça o vínculo histórico e cultural com o rio e a identidade Juruna/Yudjá. Também mobiliza toda a comunidade em torno de uma atividade de turismo comunitário que faz frente ao desmatamento e à degradação, e que permite expressar a história de luta do povo pela vida em seu território ancestral.
A Canoada Xingu
A jornada acontece de 22 a 27 de novembro de 2025 na Volta Grande do Xingu, no Pará. A expedição parte de Altamira, município que mais emite gases do efeito estufa no Brasil, e percorre aproximadamente 110km a remo pelo Rio Xingu em direção à Terra Indígena Paquiçamba. Os viajantes remam em canoas tradicionais de madeira, conduzidos por experientes guias Juruna/Yudjá, testemunham as transformações causada por Belo Monte, conhecem as ameaças de Belo Sun, o novo projeto de mineração que pretende se instalar na região, vivenciam a biodiversidade única da Volta Grande e visitam aldeias e lugares sagrados da cultura Juruna/Yudjá, como a cachoeira do Jericoá, que é o símbolo do surgimento do mundo em sua mitologia.
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A 5ª Canoada Xingu aconteceu entre os dias 3 a 8 de setembro de 2018, percorrendo mais de 100 km da Volta Grande do rio Xingu (PA)|Marcelo Soubhia/ISA
Agenda da Canoada
● Dia 1: Chegada dos participantes e deslocamento para o Retiro Betânia, onde acontece uma reunião com os guias da Canoada, instruções sobre os protocolos de segurança e organização final de equipamentos. ● Dia 2: Início da Canoada. Saída de Altamira rumo à Praia do Tucum, onde acontece uma roda de conversa sobre os impactos de Belo Monte. Pernoite na Praia do Caju. ● Dia 3: O grupo rema até a Praia do Choro, na Terra Indígena Paquiçamba, onde irá pescar e participar de uma roda de conversa sobre o Território Juruna. ● Dia 4: Dia de atividades em terra. O grupo fará uma trilha até a Ilha do Zé Maria e depois participará de atividades de mergulho e observação de peixes, além de assistir a apresentações culturais. O pernoite, novamente, acontece na Praia do Choro. ● Dia 5: A Canoada segue para Jericoá com paradas para banho de rio e conversas. ● Dia 6: O dia começa com visita à cachoeira do Jericoá. No horário do almoço, há a opção de retornar à Altamira em uma viagem de carro que leva cerca de duas horas. Para quem ficar, há a opção de visitar a cachoeira do Camaleão e pernoitar em Jericoá. ● Dia 7: Após o café da manhã, o grupo parte para Altamira em uma viagem de carro que leva cerca de duas horas.
Observações: Pernoites são feitos em barracas nas praias ou em redes com mosquiteiros. Os participantes são responsáveis por levar seus equipamentos pessoais como, redes, mosquiteiros e barracas.
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Card/Divulgação
Sobre os Juruna/Yudjá
Os Juruna/Yudjá são o povo canoeiro da Volta Grande do Xingu que habita, desde tempos imemoriais, as ilhas e penínsulas do Baixo e Médio Xingu, um dos rios mais importantes da Amazônia Meridional. Há cerca de cem anos, em consequência dos ataques sofridos contra sua população por parte das frentes de expansão não-indígenas na região, os Juruna/Yudjá acabaram se dividindo em dois grupos. Uma parte do coletivo indígena, cerca de doze pessoas, permaneceu na Volta Grande do Xingu criando a Terra Indígena Paquiçamba e preservando o território ancestral. Outra parte, cerca de 150 pessoas, remaram para a região do Alto Rio Xingu e se estabeleceram no Território Indígena do Xingu, em Mato Grosso, preservando a língua e outras tradições culturais.
Desde 2011, esses dois grupos protagonizam um processo de intercâmbio e de trocas entre parentes para reforçar sua matriz cultural e suas relações de parentesco após mais de cem anos de separação, marcados pelos impactos da colonização, do ciclo da borracha, da abertura da Transamazônica e, mais recentemente, da usina de Belo Monte. A Canoada no Xingu reforça esse vínculo histórico e cultural com o rio, paisagem viva da memória passada e presente da identidade Juruna/Yudjá. Remar junto aos Juruna/Yudjá da Volta Grande é celebrar esse vínculo de luta, resistência e a história de defesa pela vida e pelas águas do Rio Xingu.
Pacotes
O pacote individual custa R$ 9.900,00 . O valor inclui hospedagem em Altamira, deslocamentos locais, refeições durante toda a jornada, guias, canoas e remos, coletes, equipe médica de apoio e registros audiovisuais. O pacote não incluí o trajeto aéreo até Altamira, no Pará, barracas, redes, mosquiteiros e itens de uso pessoal.
Para mais informações sobre valores e reservas (WhatsApp): +55 93 99129‐2846.
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Festival do Rio destaca “O Pai e o Pajé”, documentário sobre fé e identidade do povo Kaiabi
Documentário foi selecionado para a categoria ligada à COP30 e mergulha nas visões de uma família indígena diante da presença do cristianismo no Xingu
O Festival do Rio, um dos mais importantes eventos do cinema brasileiro, terá em sua programação a exibição de “O Pai e o Pajé”, documentário dirigido por Iawarete Kaiabi e co-dirigido por Felipe Tomazelli e Luís Villaça. A obra foi selecionada para a mostra Première Brasil: Estado das Coisas, uma curadoria de filmes que dialogam com os temas da COP 30, e será apresentada ao público nos dias 08, 09, 10 e 11/10, com debate após a exibição no dia 09/10.
O longa aparece ao lado de títulos como “Reconhecidos”, “Com Causa”, “Itacoatiaras”, “Rua do Pescador, nº 6”, “Do outro lado do pavilhão”, “Invencíveis”, “Pau d’Arco”, “Cadernos Negros” e “Na onda da Maré”.
Em “O Pai e o Pajé”, Iawarete Kaiabi volta-se para dentro de sua própria família para entender os caminhos de aprendizado com seu tio Pajé e seu pai Pastor. Em um relato íntimo, ele reflete se possível uma coexistência entre as duas visões de mundo dentro do seu povo, com a permanência das tradições ancestrais no Território Indígena do Xingu.
Mais do que um registro pessoal, o filme expõe a ação de missionários evangélicos na região e os impactos profundos que essa presença tem causado ao tecido social e identidade das diferentes etnias que vivem no Xingu.
Para quem estiver em São Paulo, o filme vai compor a categoria Mostra Brasil, na 49ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, que acontece entre os dias 16 e 30 de outubro. A programação conta com 373 filmes, vindos de 80 países, que serão exibidos em 52 salas de cinema, espaços culturais e CEUs espalhados pela capital paulista. Adquira os ingressos aqui.
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ExpoTix promove festival de diversidade e movimenta as economias do Xingu
De colar de caramujo a sal de aguapé, feira do Território Indígena do Xingu celebra produção indígena, denuncia ameaças e busca apoio para futuras edições
A artesã Babalu Kuikuro, que vive na Aldeia Yawalapiti, no Território Indígena do Xingu (TIX), é conhecida pelos colares de caramujo - a joia do Xingu - que ela confecciona desde muito jovem. Ela aprendeu a fazer os colares com o seu pai e carrega nas mãos as marcas do ofício: a peça é feita com lâminas delicadas moldadas a partir das conchas de caramujo do Cerrado, que a cada dia estão mais difíceis de serem encontradas.
Tamuwa Wauja e sua companheira, Atapuwalu Wauja, da Aldeia Piyulaga, no Alto Xingu, são produtores de sal de aguapé, extraído das cinzas do aguapé, planta aquática manejada pelas famílias xinguanas.
Primeiro vem a coleta da planta aquática e, em seguida, acontece o longo processo de secar, cozinhar, desidratar e pilar. O resultado é um sal fino, claro e saboroso. “Esse é um tempero bastante usado com peixe assado e pirão. Pode ser puro ou misturado com pimenta. E é usado no Xingu todo também como remédio”, explica Tamuwa. Além dos Wauja, os principais produtores do sal de aguapé são os Aweti e Mehinaku.
Já Kumesiperiru Wauja é produtora de héjés - ou tachos para fazer beiju -, panelas, xícaras e outros utensílios feitos com argila, matéria-prima que leva até cinco horas de caminhada para ser encontrada. O cauxi (esponja de água doce), também usado nos objetos, está cada vez mais raro no Xingu devido às mudanças climáticas. As peças são desejadas por sua beleza e por terem uso antigo e tradicional, sendo ideais para a culinária indígena.
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Peças de Kumesiperiru Wauja, produtora de cerâmica tradicional, são desejadas pela beleza e utilidade na culinária indígena|Ana Amélia Hamdan/ISA
Os colares de caramujo, o sal de aguapé - delicadamente guardado em embalagem de folhas secas - e a cerâmica Wauja compuseram, junto com outros produtos, um verdadeiro festival de diversidade na 2ª ExpoTix - Feira e Exposição dos Produtos do Território Indígena do Xingu, entre os dias 16 e 19 de setembro, na aldeia Khikatxi, TI Wawi. Este ano, a ExpoTix comemorou também os 30 Anos da Associação Terra Indígena Xingu (ATIX).
O encontro teve a participação de representantes dos 16 povos do TIX e contou com cerca de 700 pessoas, principalmente indígenas. Povos de fora, como os Xavante e Panará, também estiveram presentes. Na parte cultural, aconteceram danças e cantos tradicionais. As apresentações incluíram um desfile de trajes típicos dos povos, com a participação da atriz e influencer Simone Sampaio, e show do DJ Eric Terena. Os comunicadores indígenas da ATIX e da Associação Indígena Khisêtjê (AIK) fizeram a cobertura do evento.
Presidente da ATIX, Ianukulá Kaiabi Suia considera que a ExpoTix promove a compra e venda de produtos, mas vai muito além. O encontro valoriza a roça e a comida tradicional, promove o intercâmbio entre os povos, fortalece o território e as economias do Xingu, combatendo a visão preconceituosa de que o indígena não produz.
A ATIX já planeja a terceira edição e, para isso, lançou a Carta da 2ª ExpoTix, que denuncia pressões que colocam em risco os modos de vida e produção dos povos do Xingu, desde o agronegócio até a alimentação ultraprocessada. O texto também indica e cobra apoio e políticas públicas que fortaleçam os povos, a cultura e as economias da sociobiodiversidade dos xinguanos.
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Na parte cultural, aconteceram danças, cantos tradicionais e um desfile de trajes típicos dos povos|Kamikia Khisêtjê
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A diretora de Etnodesenvolvimento Territorial da ATIX Watatakalu Yawalapiti e a atriz Simone Sampaio|Ana Amélia Hamdan/ISA
“Esse nosso projeto mostra que as terras indígenas têm produções que não são conhecidas e precisam ser valorizadas. Estamos dizendo para a sociedade não indígena e até para nós mesmos que os nossos produtos são todos orgânicos e deveriam ser reconhecidos e valorizados no mundo comercial também. Além disso, as nossas manifestações culturais estão fortemente ligadas aos nossos produtos das roças. Não é por acaso que existe a Festa do Pequi, a Festa da Mandioca, a Festa do Milho. Estamos falando de dinheiro, compra e venda, mas o nosso sistema tradicional de troca também permanece, com a realização do Moitará”, disse. O Moitará (troca) é um ritual tradicional de trocas e partilhas.
Produtores que participaram da ExpoTix aprovaram a feira e já se preparam para a próxima edição.
“Achei muito bom. Eu vendi bastante e também fiz muitas trocas. Eu trouxe para casa colar de tucum do pessoal do Baixo Xingu, farinha dos Khisêtjê, cestaria, urucum e também peixe seco. Esses foram os produtos que eu trouxe da ExpoTix”, conta Babalu Kuikuro. Ela também conseguiu a matéria-prima para confeccionar seus colares. Bernardina Xavante, da aldeia Abelhinha, Terra Indígena Sangradouro, encontrou as conchas na sua região, levou para a feira e trocou com Babalu, que entregou miçangas a ela.
Kumesiperiru, a artesã do povo Wauja, também vendeu e trocou peças. Ao fim da feira, levou na sua bagagem farinha Kaiabi, banana Khisêtjê e goiaba da mata para plantar.
Para o produtor Yaiku Tapayuna, da Associação Tapayuna (AIT), outra importância da feira é a troca de experiências. “A importância da feira é cada um conhecer a produção do outro e trocar experiências. Isso é importante para manter nossa cultura, nossa tradição e nossa forma de trabalhar. E isso depende da nossa organização. Na feira, estamos todos animados, mulheres, jovens e os parceiros. A feira é importante e mostra a nossa diversidade cultural e de alimentos”, diz.
Coordenador do Programa Xingu do Instituto Socioambiental (ISA), Roberto Rezende esteve na comemoração dos 30 Anos da ATIX e na ExpoTix. Ele ressaltou a importância da diversidade presente na feira, resultado dos modos de vida e produção dos povos indígenas.
“A gente vê aqui cerâmica, tecidos, cestaria, artesanato, comida, beiju, peixe. Mas há produções que resultam das práticas dos povos do Xingu que não cabem em nenhuma exposição. Enquanto o modelo não indígena de produção não gera diversidade e está causando degradação, o modelo diverso dos povos indígenas está interligado à floresta, que produz água, regula o clima”, explicou. “Então, sempre que alguém disser que os povos indígenas produzem pouco, podemos dizer que produzem muito, inclusive porque também produzem o mais essencial hoje: a regulação do clima e a chuva. Isso está começando a ser discutido como serviço ambiental, que é você remunerar os povos que produzem floresta e que produzem diversidade com esse trabalho", disse.
Assessora do Programa Xingu do ISA, Kátia Ono também ressalta a diversidade da ExpoTix, destacando as matérias-primas - algumas raras - que foram encontradas na feira. Uma delas é a resina usada em flechas e também no artesanato.
Ao circular entre os produtores, ela encontrou ainda artesanato com cabaça e linha; peixe com beiju; sucos de frutas do Cerrado; doce de jatobá com mel; paçoca de amendoim, além do prato tradicional feito com massa de mandioca recheada de peixe e assada na folha de bananeira.
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Tecidos, cestaria, urucum fizeram parte das partilhas da ExpoTix|Ana Amélia Hamdan/ISA
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Os artesanatos e a resina usada em flechas também fizeram parte das trocas|Ana Amélia Hamdan/ISA
Essa diversidade foi vista durante toda a ExpoTix: milho, amendoim, cará, mandioca, mangaba, goiaba da mata, abacaxi, coco, cana, farinhas de vários tipos, peixe, beiju foram alguns dos alimentos expostos na feira.
Só na banca dos produtores Jamanary Kaiabi e sua companheira Kunhakatu Kaiabi, da Aldeia Guarujá, tinha farinha de peixe, farinha de fazer pirão, quatro tipos de amendoim, três tipos de milho e dois tipos de cará. Mas Jamanary alerta: “A gente depende da chuva, que já não acontece mais dentro do calendário tradicional”.
Outro produto de destaque foi o mel. Durante a ExpoTix, a ATIX e o ISA montaram um estande do projeto Mel dos Índios do Xingu. Além do produto, foram expostos informações, fotos e até os equipamentos usados para a produção.
Coordenador de Alternativas Econômica da ATIX, Tariaiup Kayabi informa que o projeto do mel envolve 87 apicultores dos povos Kayabi, Ikpeng, Khisêtjê, Matipu, Kalapalo e Kuikuro. A maior parte da produção é para consumo das famílias e da comunidade.
Ele conta ainda que, no passado, seu povo consumia o mel produzido pelas abelhas nativas e não conhecia a abelha Europa, produtoras do mel do Xingu. “Antes de conhecer, o meu povo tinha medo de comer o mel da abelha Apis, que tem ferrão. Pensava assim: como tem a ferroada, talvez o mel tenha veneno. Mas depois foi conhecendo. Os anciãos disseram que o mel da abelha Apis é parente do mel da abelha nativa e também combate a gripe. E assim valorizaram o mel da abelha Apis”, relata.
Os impactos das mudanças climáticas e do avanço do agronegócio também estão afetando a produção do mel. Queimadas e ataques de tatu-canastra foram alguns dos problemas relatados por Tariaiup ocorridos nos últimos anos. A saída encontrada pelos apicultores foi a adaptação: com a ação de brigadas, os incêndios diminuíram. E, para enfrentar os ataques de animais, o grupo está usando cavaletes mais altos, que deixam as colmeias mais protegidas.
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Estande do projeto Mel do Xingu, desenvolvido em parceria entre ATIX e ISA|Ana Amélia Hamdan/ISA
A questão da mudança climática esteve presente em várias das discussões que aconteceram dentro da programação.
“A mudança climática mudou nossos indicadores, que eram o canto do pássaro, o vento, o calor, a umidade. Com essa mudança, de repente vem a chuva. E aí atrapalha o tempo de queima da roça. Agora, a queima da roça dá mais trabalho”, disse Yaiku Tapayuna. Ele levou para a feira artesanato, farinha azeda, farinha de puba, castanha de pequi. Um produto foi destaque: a goiaba da mata, que quase ninguém conhecia.
“Veio o sistema de homem branco e primeiro achamos lindo. Mas dentro do nosso sistema de produção, ninguém coloca veneno. Na nossa tradição, o nosso adubo é a nossa fala. Temos a forma de fazer o canto para adubar a terra”, refletiu.
Na mesa da Comissão de Alimentos Tradicionais dos Povos (Catrapovos), conduzida por Marcelo Martins, articulador territorial do ISA, foram debatidas as políticas públicas de aquisição de alimentos, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Foi trazido também o tema da adaptação, ou seja, medidas que os povos do TIX já estão tomando para se ajustarem às mudanças do clima, entre elas formas de irrigação; manejo do fogo; modos de fazer roça ou de organização das comunidades.
Liderança indígena e ativista, Watatakalu Yawalapiti, diretora de Etnodesenvolvimento Territorial da ATIX, conduziu a roda de conversa das mulheres.
“Estamos na 2ª ExpoTix e não há como não falar das mulheres quando se fala em bioeconomia. Elas cuidam das roças, fazem farinha e polvilho. E repassam esse conhecimento para os filhos e filhas. Os municípios, instituições governamentais e não governamentais precisam olhar para essas mulheres. Este ano vamos receber a COP30 e precisamos olhar para as mulheres que fazem a sustentabilidade dentro dos territórios indígenas”, disse.
Durante o debate, a questão da qualidade da alimentação foi um dos temas de destaque, com a preocupação com o consumo de ultraprocessados trazidos de fora. Consta da Carta da 2ª ExpoTix a ampliação da alimentação tradicional nas escolas e também nas unidades da saúde indígena.
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Sal de aguapé, guardado em embalagem de folhas secas: produto é usado como tempero e remédio|Ana Amélia Hamdan/ISA
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Peixe com beiju faz parte da cultura alimentar xinguana|Ana Amélia Hamdan/ISA
A médica sanitarista Sofia Mendonça, coordenadora do Projeto Xingu da Unifesp, fez uma apresentação indicando a mudança nas doenças que predominam no território, com o avanço de doenças não transmissíveis, como diabetes e hipertensão, muitas vezes ligadas a hábitos alimentares. Ela ressaltou a importância da feira também para saúde, já que valoriza a alimentação tradicional e saudável.
Liderança jovem, Lewaiki Khisêtjê trouxe reflexões sobre a potência das economias indígenas.
“Com esses projetos sustentáveis que a gente tem, podemos mostrar para as pessoas que existe uma economia diferente, não uma economia que destrói tudo, que está matando o nosso planeta. Então, esse é o momento exato de mostrar os nossos produtos da roça, os nossos projetos nos territórios e fazer uma educação para o não indígena, de como preservar, de como manter a floresta em pé. A gente tem a nossa renda, que beneficia a comunidade e os povos. A gente não quer o lucro só pra gente, como o agro quer. Para nós, a sociobioeconomia é isso”, resumiu.
O encontro foi realizado pela ATIX em parceria com a Secel/MT, Governo de Mato Grosso, Ministério da Cultura e Governo Federal, no âmbito do edital Feiras de Economia Criativa e Solidária – Edição Lei Paulo Gustavo, com apoio da Embaixada da França no Brasil, Energisa MT, Funai, Instituto Socioambiental (ISA), Dsei - Xingu, Unifesp (Projeto Xingu), Imaflora, Rede de Sementes do Xingu, Rede Xingu Mais, AIK Produções e Coiab.
Resistência e celebração: ATIX comemora seus 30 anos com cerimônia tradicional
A Associação Terra Indígena Xingu (ATIX) celebrou seus 30 anos de criação com uma grande festa tradicional na aldeia Khikatxi, do povo Khisêtjê. O evento marcou três décadas de luta, resistência e dedicação à preservação da vida e da cultura no Xingu. A solenidade de abertura foi carregada de significado, com o povo Khisêtjê acompanhando a diretoria da ATIX da casa do cacique Kuiussi Suya até o centro da aldeia (Ngá).
Durante a cerimônia, o cacique Kuiussi Suya expressou sua profunda alegria em sediar o encontro, que reuniu representantes de diversos povos: Kuikuro, Wauja, Matipu, Mehinako, Yawalapiti, Kalapalo, Nahukwá, Ikpeng, Awetí, Kamaiurá, Yudjá (Juruna), Kawaiwete (Kaiabi), Trumai, Khisêtjê (Suia) e Kajkwakratxi (Tapayuna).
Em sua fala, o presidente da ATIX, Ianukulá Kaiabi Suya destacou a mensagem central da celebração, que contou com a presença de parceiros. O secretário executivo do ISA, Rodrigo Junqueira, o coordenador do Programa Xingu, Roberto Rezende, o coordenador-adjunto do Programa Xingu, Ivã Bocchini, e outros membros da equipe estiveram presentes.
"A gente chega nos 30 anos da ATIX com a mensagem principal: 30 anos de luta, 30 anos de resistência. A ATIX consegue mostrar à sociedade não indígena que é possível adotar alguns sistemas de organização do "homem branco" ao seu próprio jeito, preservando e protegendo a instituição e a floresta por muitos anos”, disse Ianukulá Kaiabi Suia.
As celebrações contaram com a presença de ex-presidentes da ATIX e lideranças, entre eles Winti Suia, Mairawe Kaiabi e Tapi Yawalapiti. A celebração incluiu competições tradicionais, como torneio de arco e flecha e corrida, reafirmando a força da tradição dos povos do Xingu.
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Transição Energética Justa e Popular: sociedade civil pede ao Brasil liderança pelo exemplo na COP 30
Documento alerta para risco de contradições internas e pede que o Brasil lidere na COP 30 defendendo planos de transição energética justa em todos os países
Mais de 50 redes e organizações da sociedade civil divulgaram nesta terça-feira (23/10) a Carta Aberta “Transição Energética Justa e Popular: A presidência brasileira na COP 30 e a necessidade de liderar pelo exemplo”. O documento, enviado a ministros e autoridades brasileiras, alerta para o risco do país chegar à conferência do clima da ONU em Belém, que acontece em dois meses, sem corresponder às expectativas de liderança na transição energética, e também aponta caminhos concretos para que o Brasil exerça protagonismo e lidere pelo exemplo.
A Carta reconhece o esforço do governo em incluir a transição energética justa entre as prioridades da COP 30 e defende que o Brasil proponha que todos os países adotem planos de transição vinculados às suas NDCs (Contribuição Nacionalmente Determinada), elaborados com governança democrática, transparência e participação social efetiva em todas as etapas, evitando o velho modelo autoritário de planejamento. O texto ressalta a necessidade de metas ambiciosas para redução de emissões e a substituição do uso de combustíveis fósseis, junto com a democratização do acesso e geração de energia, e a aplicação de rigorosas salvaguardas socioambientais para novos empreendimentos do setor, com respeito ao Consentimento Livre, Prévio e Informado (CLPI). Cobra o desenvolvimento de ressalvas específicas para a exploração de minerais utilizados em estratégias de transição energética, assegurando proteção ambiental e respeito aos territórios, além da construção de mecanismos de financiamento inovadores, que estimulem alternativas sustentáveis, em vez de apostar, por exemplo, na contradição de financiar a transição com a própria expansão do petróleo.
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Enquanto o Brasil promete liderar a transição energética, segue investindo em atividades de grande impacto socioambiental|Divulgação/Petrobrás
Mas, para que esse papel de liderança seja crível, o Brasil precisa começar pelo exemplo dentro de casa, alertaram as redes e organizações. Apesar de esforços recentes, como a criação da Política Nacional de Transição Energética (PONTE), do Plano (PLANTE) e do Fórum Nacional de Transição Energética (FONTE), concebidos também como espaço de participação social, os avanços ainda não são concretos. O FONTE sequer se reuniu e o PLANTE segue sendo elaborado de forma centralizada pelo Ministério de Minas e Energia (MME), sem transparência metodológica e sem participação efetiva da sociedade.
Enquanto isso, o governo anunciou medidas contraditórias, como a exploração de petróleo na Margem Equatorial, na foz do rio Amazonas, interesse na indústria nuclear, inclusive com a hipótese de reatores flutuantes na Amazônia; a proposta de uma nova hidrelétrica de grande porte na fronteira de Rondônia com a Bolívia, repetindo problemas já documentados nas hidrelétricas de Santo Antônio, Jirau (RO) e Belo Monte (PA); além da expansão de eólicas e solares no Nordeste, sem salvaguardas socioambientais, acumulam impactos e pressionam comunidades.
As organizações concluem que o Brasil só poderá exercer liderança na COP 30 se conduzir uma transição energética justa e popular com transparência, participação social e respeito aos direitos humanos e aos territórios.
A Carta é co-assinada pelas seguintes redes da sociedade civil: GT Infraestrutura e Justiça Socioambiental, GT Clima e Energia / Observatório do Clima, Frente por uma Nova Política Energética – FNPE, Coalizão Energia Limpa, Coletivo Nordeste Potência, Coletivo Ativista, Comitê de Defesa da Vida Amazônica na bacia do Rio Madeira- COMVIDA, Comitê de Energia Renovável do Semi-Árido (CERSA), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), Articulação Antinuclear Brasileira, Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Socioambiental – FMCJS, Fórum Nacional da Sociedade Civil nos Comitês de Bacias Hidrográficas – FONASC, Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais - FBOMS, Teia Carta da Terra Brasil, Rede Convergência pelo Clima – Bahia, Coalizão pelos Rios, Coletivo Ativista, Grupo de Trabalho Amazônico - GTA, Mulheres Unidas Com o Brasil – MUCB, Rede Brasileira de Justiça Ambiental - RBJA, Rede Mata Atlântica, Rede Pantanal, Rede Pampa e Rede Ambiental do Piauí
Também subscrevem a carta aberta as seguintes organizações: 350.org Brasil, Associação Alternativa Terrazul, Associação Mineira de Defesa do Ambiente – Amda, Associação Movimento Paulo Jackson - Ética, Justiça, Cidadania, ASIBAMA-RS, Associação Mulheres na Comunicação – AMC, Centro de Estudos Ambientais- RS, Centro Palmares de Estudos e Assessoria por Direitos, ClimaInfo, Conectas Direitos Humanos, Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras, ECOA - Ecologia e Ação, FASE – Solidariedade e Educação, Fundação Ecológica Cristalino – FEC, Fundação Grupo Esquel Brasil – FGEB, Greenpeace Brasil, Grupo Ambientalista da Bahia – GAMBÁ, Grupo de Estudos em Educação e Meio Ambiente – GEEMA, Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Gênero e Água – GENÁGUA, Instituto de Energia e Meio Ambiente - IEMA, Instituto de Estudos Socioeconômicos – INESC, Instituto Floresta Viva, Instituto Madeira Vivo- IMV, Instituto Socioambiental - ISA, Instituto Zé Claudio e Maria, International Rivers, Laboratório de Pesquisa em Política Ambiental e Justiça - LAPAJ, Projeto Saúde e Alegria, SOS Chapada dos Veadeiros e Transparência Internacional - Brasil