Nota Técnica propõe flexibilização tributária para impulsionar a cadeia da restauração no Plano de Transformação Ecológica e Planaveg
A produção de sementes nativas, essencial para a restauração de ecossistemas em grande escala no Brasil, enfrenta um grande desafio: a elevada carga tributária que incide sobre sua produção e comercialização. É o que aborda a Nota Técnica "Tributação da cadeia produtiva de sementes nativas para a restauração de ecossistemas no Brasil", elaborada pelo Redário, uma articulação composta por 26 grupos e redes de coletores de sementes de base comunitária, compostos por agricultores familiares, comunidades tradicionais, indígenas e assentados.
Liderada pelo Instituto Socioambiental (ISA), a Rede de Sementes do Cerrado (RSC) e outras organizações do setor, a NT explica as dificuldades enfrentadas e destaca recomendações, como a implementação de benefícios fiscais e isenção de impostos para produtores de sementes nativas e outros elos da cadeia da restauração. Estas propostas são muito pertinentes no âmbito do Plano de Transformação Ecológica (PTE) e do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg), para habilitar o Brasil a cumprir suas metas de restauração já assumidas, na velocidade e na escala necessárias.
O documento foi revisado e apoiado pelo Comitê Técnico de Sementes Florestais (CTSF), e pelas redes biomaticas Pacto pela Restauração da Mata Atlântica, Aliança pela Restauração na Amazônia, Articulação pela Restauração do Cerrado (Aracticum), Rede Sul de Restauração Ecológica e Rede para a Restauração da Caatinga (Recaa) e entregue em mãos nesta terça-feira (27/08), durante a reunião ordinária da Comissão Nacional para Recuperação da Vegetação Nativa (Conaveg).
Apesar dos compromissos do governo brasileiro com relação a políticas públicas para alavancar o setor, a pesada tributação retarda o crescimento da produção de sementes para essa finalidade. São necessários incentivos fiscais para as sementes produzidas por povos indígenas, comunidades tradicionais e agricultores familiares, que são atualmente os maiores fornecedores de sementes para restauração ecológica no país.O cenário tributário do Brasil tem favorecido a agropecuária e ameaçado o cumprimento da meta nacional de restaurar 12 milhões de hectares até 2030.
Ao apresentar em detalhes os impostos que incidem sobre o comércio de sementes nativas, a Nota Técnica chama a atenção para a realidade tributária brasileira, que concede renúncias fiscais, subsídios e isenções para toda a cadeia da soja, inclusive suas sementes, mas onera produtores de sementes nativas.
De acordo com o documento, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) é o tributo que mais impacta sobre o preço de sementes nativas. As alíquotas variam entre 7% e 22%, dependendo do estado brasileiro e da natureza da operação. Apesar do Convênio ICMS 100/1997, que prevê isenções e reduções para insumos agropecuários, incluindo sementes nativas, poucos produtores conseguem acessar esses benefícios, devido à burocracia envolvida.
Entre as principais justificativas para a flexibilização tributária está o fato que, embora existam sinalizações de que a reforma tributária em discussão neste momento trará regras mais favoráveis para a cadeia de sementes nativas produzidas por associações e cooperativas, estas entrarão em vigor apenas em 2033, quando a Década da Restauração de Ecossistema da ONU e o prazo das metas de restauração assumidas pelo Brasil já terão terminado há 3 anos.
“Considerando a importância social e ambiental desta atividade, esperamos que durante a transição entre os sistemas tributários, todos os governos criem mecanismos de flexibilização das regras atuais para desonerar a cadeia produtiva da restauração e apoiar o Brasil a atingir a meta de restaurar 12 milhões de hectares até 2030”, diz a Nota.
Recomendações
Resultado de estudos detalhados de custos e tributações para o empreendedorismo na cadeia produtiva de sementes nativas para a restauração de ecossistemas no Brasil, a Nota Técnica propõe recomendações para melhorar esta situação no país.
Entre elas está a flexibilização das regras para a obtenção de isenções fiscais por organizações sem fins lucrativos e para adesão dos produtores ao Convênio ICMS 100/1997, que prevê isenção e redução do ICMS para insumos agropecuários. Além disso, sugere que os estados sigam o exemplo de Mato Grosso, que possui uma legislação específica para isenção de ICMS na comercialização interna de sementes nativas.
A Nota Técnica recomenda também que, durante a transição para o novo sistema tributário, os governos estaduais e federal adotem medidas urgentes para flexibilizar as regras atuais e desonerar a cadeia produtiva de sementes nativas.
“É crucial promover uma articulação eficaz entre governo federal, estadual e municipal. Essa colaboração deve focar na implementação de ações de fomento e incentivos econômicos, como isenções fiscais e tributárias, especialmente voltadas para produtores de sementes de base comunitária, incluindo povos indígenas, povos e comunidades tradicionais e agricultores familiares (PIPCTAF). A concessão dessas isenções fiscais beneficiará o alcance das metas brasileiras de clima e biodiversidade e terá um impacto econômico reduzido nas receitas públicas, uma vez que se trata ainda de uma atividade econômica de menor escala”, pontua o documento.
Nesse contexto, o ideal para os produtores de sementes com a finalidade de restauração seria a aprovação de mecanismos específicos de isenção desses impostos pelo legislativo brasileiro, a exemplo da cadeia produtiva da soja.
Planaveg
A Conaveg é responsável por coordenar as ações do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg), que tem como objetivo restaurar 12 milhões de hectares até 2030. A apreciação do texto do Planaveg que irá a consulta pública e a definição do cronograma de tramitação aconteceram durante a reunião desta terça-feira. Sendo assim, a apresentação desta Nota Técnica na reunião é um passo importante para alinhar as políticas tributárias com as metas de restauração ambiental do país.