Relatório do ISA e da UFRJ aponta que a dotação orçamentária inicial para a gestão ambiental no Brasil caiu 71% entre 2014 e 2021
O orçamento de órgãos federais com funções socioambientais vem caindo significativamente nos últimos oito anos, mas chegou ao fundo do poço no Governo Bolsonaro, atingindo o menor valor dos últimos 17 anos. Os recursos são usados no combate ao desmatamento e às queimadas, na oficialização e manutenção de Áreas Protegidas e na proteção a comunidades indígenas e tradicionais.
É o que aponta o relatório “O financiamento da gestão ambiental no Brasil: uma avaliação a partir do orçamento público federal", feito pelo Instituto Socioambiental (ISA) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
O documento reúne informações de 2005 a 2022 sobre o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e os principais órgãos a ele subordinados, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), responsável pela gestão das Unidades de Conservação (UCs) federais.
Conforme mostra o estudo, a dotação orçamentária inicial para a gestão ambiental no Brasil caiu 71%, despencando de R$ 13,1 bilhões, em 2014, quando alcançou seu maior patamar na história, para R$ 3,7 bilhões, em 2021.
A dotação orçamentária é o total de recursos reservados para um determinado fim pela Lei Orçamentária Anual (LOA), mas que, em geral, não é totalmente pago. Já o gasto efetivamente realizado diminuiu 45%, caindo de R$ 5,7 bilhões para R$ 3,1 bilhões no mesmo período.
O rombo é ainda maior se analisados órgãos, funções e períodos específicos, principalmente na comparação com a atual gestão. Tomando como referência o ano de 2012, a dotação orçamentária em 2021 teve uma redução de 66%. Considerando apenas o MMA, e não os órgãos a ele subordinados, o tombo foi ainda maior: a dotação inicial e os gastos discricionários efetivos despencaram 72% e 86%, respectivamente, no mesmo período.
Em 2012, foi registrada a menor taxa da série histórica do desmatamento da Amazônia, coincidindo com o fim de um período de consolidação de importantes medidas de gestão ambiental, como a criação e gestão de áreas protegidas, as políticas de comando e o controle e monitoramento ambiental.
Gasto discricionário
De 2018 a 2021, o gasto discricionário realizado pela pasta sofreu uma queda de 56%. Em resumo, no ano passado os recursos gastos efetivamente pela pasta foram cinco vezes menores do que em 2017 e são os menores para toda a série histórica.
A despesa discricionária é aquela destinada às ações finalísticas das instituições oficiais, excluídos os gastos obrigatórios, por exemplo, com salários, previdência, outros encargos sociais e dívidas.
“Além das medidas de flexibilização das normas ambientais brasileiras, incentivando práticas predatórias nos biomas, desde 2019 o país vem apresentando uma baixa execução orçamentária, o que dificulta ainda mais a implementação das políticas ambientais. Ou seja, além da redução nos orçamentos, os órgãos não gastam 100% do orçamento aprovado”, explica Antonio Oviedo, assessor do ISA e um dos autores da análise.
O relatório também analisou os orçamentos do Serviço Florestal Brasileiro (SFB); do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que monitora o desmatamento; da Funai, responsável pela demarcação das Terras Indígenas; e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que tem a competência de regularizar os territórios quilombolas.
Orçamento público
A análise confirma o diagnóstico de que o “desmonte ambiental” promovido pelo governo Bolsonaro também afetou o orçamento público, junto com o enfraquecimento de instâncias de participação, legislação, políticas e órgãos do setor.
“Em paralelo à flexibilização da regulação ambiental e o desmonte institucional dos principais órgãos executores da política ambiental, nos últimos anos o Brasil adotou uma série de políticas de austeridade fiscal que, ao constranger o direcionamento de recursos necessários para a execução da política, colocam em risco a continuidade de importantes programas de combate à degradação ambiental”, diz o estudo.
Ele reforça ainda que o desmantelamento das políticas ambientais resultou em recordes de desmatamento e queimadas no país, o avanço das invasões sobre as áreas protegidas e da grilagem de terras. No ano passado, a taxa de desmatamento na Amazônia chegou a 13 mil km2, o terceiro recorde sucessivo e o maior número em 16 anos.
“Essa redução tem consequências gravíssimas. De 2018 a 2021, observamos um aumento de 149% no desmatamento em Unidades de Conservação federais e de mais de 34 % em Terras Indígenas. No Bioma Pantanal, a redução da superfície de água teve um aumento de 27,9% no mesmo período”, ressalta Oviedo.
Destaques do relatório
- Os resultados mostram a queda na execução orçamentária do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), especialmente no período de implementação do Código Florestal. Entre 2018 e 2019, os valores destinados ao órgão foram reduzidos de R$ 147,5 milhões para R$ 85,1 milhões (queda de 27,2%). Os valores dos anos seguintes continuaram caindo, chegando a um patamar de R$ 51,46 para o ano de 2022. Entre 2019 e 2022, houve uma nova queda na dotação inicial destinada ao órgão de 39,6%.
- A Funai apresentou em 2021 a menor dotação inicial do período analisado, com uma redução quando comparamos o maior orçamento da série histórica, que atinge 43%. Entre 2018 e 2022, houve redução de quase um quarto dos recursos destinados ao órgão, de R$ 715,7 milhões para R$ 561,6 milhões.
- O Inpe, responsável por uma das principais medidas que reduziu o desmatamento em 83%, entre os anos de 2004 a 2012, já sofreu redução de 74% em suas despesas (dotação inicial).
- O orçamento voltado às indenizações, à demarcação dos territórios e à promoção das comunidades quilombolas para o Brasil é irrisório, acumulando uma redução de 100%. O mesmo para a demarcação das TIs, que já reduziu 71%.
- Com relação à gestão das TIs e UCs, hoje o país investe R$ 17,00 por hectare de TI e R$ 7,00 por hectare de UC.