O sócio-fundador e presidente do ISA, Márcio Santilli, fala sobre a força e potencial das mobilizações da sociedade civil nas COPs em geral e na conferência de Belém, no mês que vem

Artigo publicado originalmente em 16/10/2025, no site da Mídia Ninja
COP quer dizer “Conferência das Partes” e é a reunião entre os países, membros da ONU, que participam de um determinado tratado ou convenção. São reuniões periódicas, em que os diplomatas negociam acordos e ações conjuntas, atualizam dados e avaliam a evolução da implementação desses tratados.
COP costuma ser assunto de especialistas, de pouco interesse para os comuns mortais. Mas, no Brasil, nunca se falou tanto de COP como agora, quando se aproxima a realização, em Belém (PA), no mês que vem, da COP-30, a trigésima conferência sobre a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, assinada pelos chefes de estado em 1992, no Rio de Janeiro. O evento chega à Amazônia 33 anos depois.
Quase todo mundo quer ir a Belém. Para os de fora, é uma oportunidade especial para estar na Amazônia, numa encantadora capital cheia de mangueiras e de manguezais, além, claro, de milhões de paraenses. Para os de dentro, é hora de atrair, da multidão visitante, apoiadores para projetos mais perenes.
Zona Azul
Zona Azul é como se chama a área em que ocorrerá a reunião oficial. Espaço nobre, auditórios, restaurantes. Uma cidadela dentro da cidade. É lá que circularão as delegações e as personalidades, é onde se farão as reuniões formais e se chegará, ou não, a novos acordos sobre o clima. É o foco da badalação.
Os representantes oficiais dos governos têm presença garantida. Mas, para os da sociedade civil e do movimento social, exige-se um crachá específico, que está sendo disponibilizado a conta-gotas e, no momento, é o objeto de desejo de meio mundo. Afinal, deslocar-se até Belém e não pisar na Zona Azul, pode soar bem mal.
Significa que apenas algumas centenas ou poucos milhares de pessoas, entre as centenas de milhares que estarão em Belém, vão poder, de fato, acompanhar ou participar diretamente das negociações. Sem esquecer que há muitas cartas marcadas nesse jogo e quem o decide já deve ter decidido antes dele começar.
Nem tudo estará azul nessa zona. Os Estados Unidos, maior emissor histórico de gases do efeito estufa e segundo maior emissor atual, estão, sob a presidência de Donald Trump, retirando-se outra vez das negociações internacionais. O confronto entre a Rússia e a Ucrânia continua e a paranóia da guerra espalha-se pela Europa, que está investindo pesado em armas em vez de combater a fome, a violência e o efeito estufa.
Até agora, a maioria dos países ainda não apresentou as suas NDCs, que são as propostas em que definem as medidas que pretendem tomar e as metas de redução de emissões que se dispõem a cumprir nos próximos anos. Apesar do agravamento da situação climática, dos prejuízos e sofrimentos que ela acarreta, poucos países aumentarão os seus esforços e as perspectivas, principalmente para os povos mais vulneráveis, são sombrias.

Lado de fora
Não valerá a pena ficar muito tempo de bobeira na Zona Azul. Belém estará repleta de espaços alternativos, com muitos eventos políticos e culturais, com informações e debates essenciais, produtos da floresta, festas e gentes de todas as cores e amores. O Museu Emílio Goeldi estará aberto ao público, que terá acesso a um pouco do melhor conhecimento científico disponível sobre a Amazônia.
Estarão em Belém milhares de representantes indígenas, quilombolas, afrodescendentes, extrativistas e agricultores familiares de todas as partes da Pan-amazônia, e só alguns terão acesso à Zona Azul. Mas eles estarão relatando as suas experiências em enfrentar os impactos da mudança climática nos seus territórios. Haverá manifestações massivas pelas ruas e praças da cidade.
Todo mundo estará torcendo para que a COP-30 seja um sucesso, que mais países apresentem suas NDCs e que haja acordo em torno de metas mais ousadas de redução de emissões. Também se espera que mais recursos sejam disponibilizados para bancar a adaptação dos países e povos mais vulneráveis à mudança do clima. Tomara que a China, maior emissora atual, e o Brasil, como anfitrião, anunciem novas providências e ocupem os espaços vazios nas negociações.
Os processos multilaterais são complexos, penosos e lentos ao extremo. São as pressões de fora para dentro que podem movê-los. Tragédias climáticas instigam as consciências, mas só o clamor das ruas pode mover as montanhas. Em todas as COPs, o melhor sempre esteve do lado de fora. Em Belém, não será diferente.