Publicação de pesquisas interculturais da Bacia do Rio Negro chega ao quarto número com lançamento em território indígena e em São Paulo
É mês de novembro e, na região do Alto Rio Negro (AM), dias quentes e de céu limpo se alternam com períodos de chuva e queda na temperatura. É tempo da constelação Aña ou Jararaca, quando começa o ano para os povos Tukano da região do rio Uaupés.
E foi esse período de recomeços o escolhido para o lançamento do volume 4 da Aru – Revista de Pesquisa Intercultural da Bacia do Rio Negro, Amazônia, no território indígena. Em 9 de novembro, os exemplares foram entregues aos pesquisadores indígenas na Ilha de Duraka, durante o II Encontro Geral dos Agentes Indígenas de Manejo Ambiental (AIMAs).
Na próxima terça-feira (20/12) – ainda sob a influência da constelação Aña – a Aru tem novo lançamento, desta vez na loja Floresta no Centro, em São Paulo. Será lançado em conjunto Nuances, novo livro da bióloga e especialista em biodiversidade do Instituto Socioambiental (ISA) Nurit Bensusan, com reflexões sobre a crise climática, a Amazônia, os povos indígenas e os limites da tecnologia.
O evento contará com uma roda de conversa entre Aloisio Cabalzar, antropólogo, editor da revista Aru e coordenador-adjunto do Programa Rio Negro do Instituto Socioambiental (ISA), Dagoberto Azevedo, indígena do povo Tukano, antropólogo, assessor e analista de pesquisa e desenvolvimento socioambiental do ISA e Nurit Bensusan.
A nova edição da Aru é lançada após uma pausa de três anos devido à emergência sanitária provocada pela pandemia de Covid-19. “Esse período desde a publicação do terceiro número da Aru foi de crises sobrepostas, um governo anti-indígena junto a uma pandemia global sem precedentes há mais de um século. Esse imbróglio não deixou de impactar o Rio Negro, mas a resistência também tem sido forte”, explica o texto introdutório.
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Neste volume, o tema central é o manejo de peixes, atividade fundamental para os povos do Rio Negro. São textos que trazem abordagens diversas, envolvendo desde narrativas mitológicas, passando pelo sustento familiar e chegando às atividades da economia da floresta, como turismo pesqueiro de base comunitária.
Tendo como base o trabalho da rede dos Agentes Indígenas de Manejo Ambiental (AIMAS), projeto desenvolvido em conjunto pelo Instituto Socioambiental (ISA) e Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn), os textos da Aru permitem uma aproximação com o cotidiano dos povos que vivem na Amazônia.
Em seu relato, por exemplo, o pesquisador Armindo Brazão, do povo Baniwa, conta sobre as diferenças da pescaria de acordo com a estação na Bacia do Rio Içana.
“No inverno, fazemos pescaria dentro dos igapós, onde é muito difícil acampar: todas as margens foram para o fundo e não tem lugar para atar rede. Nesta época, você só consegue matar muito peixe à noite. De dia, é um pouco difícil pescar. De noite, só se mata jundiá, bagre, carauatai, traíra, daguiru,” conta.
“Diferentemente do verão, quando todas as praias que tinham ido para o fundo aparecem, e pescamos mais de dia outros tipos de peixes, como tucunaré, jacundá, traíra, pirandira e surubim. No verão fica fácil acampar na praia e é muito bom. O mato seca muito, faz muito calor e você pesca de dia no lago, porque aqueles igapós ficaram altos e os peixes começam a se juntar nos lagos. Assim funciona cada período e cada uma das paisagens, todas importantes para a vida dos povos Baniwa”, complementa.
Já Rogelino da Cruz Alves Azevedo, do povo Tukano, relata outras observações na região do Rio Tiquié. “A primeira desova dos peixes e dos peixinhos como piabinhas começa na enchente da primeira constelação, que se chama constelação de Tatu. A seguir, vem outras constelações, como Jacundá/Camarão. Então, os peixinhos que fizeram piracemas através dessas três constelações já começam fazer migração no começo da enchente da constelação da Onça.”
A edição também traz, em suas primeiras páginas, uma parte da história do Deus Preguiça, contada e ilustrada por Feliciano Lana, conhecedor-artista que o Rio Negro lamentavelmente perdeu para a Covid-19. São desenhos antigos, de 1974, fase inicial de seus trabalhos narrativos.
Cabalzar considera que a ampla abordagem sobre um tema específico – manejo de peixe – torna a Aru de interesse para um público diverso. Os textos trazem temas como emergência climática e pesquisas feitas por indígenas que guardam e praticam um conhecimento de extrema relevância num mundo que busca alternativas de sustentabilidade.
No dia do evento, os participantes poderão adquirir os quatro volumes da Revista Aru com desconto.
Serviço:
Lançamento do volume 4 da Aru – Revista de Pesquisa Intercultural da Bacia do Rio Negro, Amazônia e do livro Nuances
Quando: 20/12
Horário: 19h
Local: Loja Floresta no Centro - Av. São Luiz, 187, na 2º sobreloja da Galeria Metrópole - República, São Paulo
Vendas: Disponíveis presencialmente na loja Floresta no Centro e on-line, pelo site loja.socioambiental.org, após o lançamento