Resultado de parceria inédita entre ISA e Anmiga, mapeamento veio a público durante primeira etapa da Conferência das Mulheres Indígenas 2024/2025, realizada na TI Aldeia Limão Verde (MS)
No dia 29 de novembro aconteceu o lançamento do Mapa das Organizações das Mulheres Indígenas no Brasil 2024, uma parceria entre a Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga) e o Instituto Socioambiental (ISA).
O evento foi sediado na Terra Indígena Aldeia Limão Verde, do povo Guarani Kaiowá (MS), durante a abertura da Conferência das Mulheres Indígenas 2024/2025, uma realização da Anmiga, dos Ministérios dos Povos Indígenas e das Mulheres e do Governo Federal.
Com o tema “Enfrentamento da violência contra as mulheres indígenas”, a Conferência, por sua vez, foi integrada à programação da XII Kuñangue Aty Guasu, a grande assembleia das mulheres guarani kaiowá e guarani ñandeva em Mato Grosso do Sul, que aconteceu entre os dias 27 e 30 de novembro – e marcou os 18 anos da existência da organização indígena.
Na ocasião, estiveram presentes autoridades como Sonia Guajarara, ministra dos Povos Indígenas; Eloy Terena, secretário-executivo dos Povos Indígenas; Pagu Rodrigues, diretora de Proteção de Direitos no Ministério das Mulheres; Putira Sacuema, diretora de Atenção Primária à Saúde Indígena (DAPSI) da Secretaria de Saúde Indígena (Sesai); Giovana Mandulão junto a Coordenadora da Gestão do Conhecimento, da Informação, do monitoramento e da avaliação de saúde indígena da Sesai; Juliana Jenipapo Kanindé, secretária dos Povos Indígenas do Ceará; e Viviane Luiza, secretária de Cidadania de Mato Grosso do Sul (MS).
O Mapa das Organizações das Mulheres Indígenas no Brasil 2024, lançado no evento, é uma parceria inédita entre as pesquisadoras da Anmiga e do ISA que busca colocar no mapa as organizações de mulheres indígenas pelo país.
A publicação possui, além do mapeamento com todas as organizações georreferenciadas, uma listagem por estado em ordem alfabética e conta ainda com artigos que se debruçam sobre a forma e as motivações das mulheres indígenas ao se organizarem, e também como a Anmiga tem desenvolvido conceitos próprios para pensar o presente das mulheres indígenas na política.
Todas as autoridades presentes na Conferência receberam em primeira mão o Mapa, assim como as anfitriãs da TI Aldeia Limão Verde; os participantes da assembleia da Kuñangue; e as 100 delegadas da Conferência das Mulheres Indígenas 2024/2025 da etapa Aroeira, eleitas localmente para representar seus estados de origem: Mato Grosso do Sul, Goiás e Distrito Federal. Foram mais de 400 kits compostos pelo mapa e dois cartazes com ilustrações da artista indígena Auá Mendes, do povo Mura, distribuídos ao longo do evento que se encerrou no sábado, dia 30 de novembro.
Joziléia Kaingang, diretora executiva da Anmiga e uma das organizadoras do Mapa, explica que ele foi resultado de uma construção conjunta, feita por uma equipe composta por mulheres, indígenas e não-indígenas, e que o lançamento demarca um momento muito significativo ao ser realizado no chão do território.
Ela pontua ainda que as mulheres indígenas mobilizadas podem inspirar novos movimentos, e que isso pode ser demonstrado nos resultados do mapeamento. “Para nós, mulheres indígenas, identificar como as organizações das mulheres indígenas vem crescendo nos últimos quatro anos é fundamental. Daqui, a gente sai com um diagnóstico também de como a incidência das mulheres indígenas em um contexto nacional, na luta nacional, também fomentou para que organizações, associações coletivas de mulheres indígenas fossem instituídas também nos territórios”, afirma.
Luma Prado, historiadora, pesquisadora no ISA e responsável pelo mapeamento, explica que as mulheres indígenas sempre estiveram em luta, e que o associativismo é apenas uma das formas de expressão desse movimento que é vivo e bastante diverso. “O mapa consegue demonstrar essa vivacidade e diversidade do movimento das mulheres indígenas que se organiza de diferentes maneiras, se renova e se transforma a todo tempo”, analisa.
“Com a intenção de acompanhar essas transformações e cientes dos limites do mapeamento, adicionamos ao Mapa um qr code que leva a um formulário. Assim, mulheres indígenas que não encontrarem sua organização no Mapa, podem adicioná-la para constar numa próxima edição, como também para que novas organizações, assim que criadas, se somem ao levantamento” salientou a pesquisadora.
A Conferência das Mulheres Indígenas 2024/2025
Na Conferência, ao longo dos dois dias de evento, aconteceram debates com especialistas e convidados e foram criados grupos de discussões sobre cinco eixos temáticos: direito e gestão territorial; emergência climática; violência de gênero; saúde; educação e a transmissão dos saberes ancestrais.
No último dia da etapa Aroeira da Conferência, a partir dos encaminhamentos realizados dentro dos grupos temáticos, foram apresentadas propostas de trabalho para serem levadas à etapa nacional da Conferência, a Copaíba, que acontecerá em Brasília entre os dias 6 e 10 de março.
Para a ministra Sonia Guajajara, o objetivo é trazer as mulheres indígenas para o debate, para que tragam seus conhecimentos para a construção de políticas públicas que respondam, de fato, às suas necessidades. “Agora vamos nessa etapa das Conferências discutir a política pública para as mulheres e nós queremos estabelecer um programa das mulheres guardiãs, tanto as mulheres guardiãs da cultura, do território, quanto as mulheres também que lutam contra a violência”, afirmou.
As próximas etapas das Conferências – Araucária, em Curitiba (PR) e Jurema, em Paulo Afonso (BA) – reunirão mulheres indígenas do Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina; e Pernambuco, Alagoas, Sergipe e norte da Bahia respectivamente. Os encontros, no entanto, ainda não tiveram uma data definida.
As demais etapas – Sumaúma, Castanheira, Sapopemba e Mangabeira – acontecem no próximo ano e devem reunir ao menos 400 mulheres indígenas. O Mapa das Organizações das Mulheres Indígenas no Brasil 2024 foi incluído no kit que será distribuído em todas as etapas da Conferência. O Mapa também está disponível online e a versão física pode ser adquirida na loja do Instituto Socioambiental, Floresta no Centro. Garanta o seu aqui.
Assembleia Kuñangue Aty Guasu
A 12ª Assembleia Geral da Kuñangue Aty Guasu aconteceu entre os dias 27 a 30 de novembro de 2024, na Terra Indígena Aldeia Limão Verde, em Amambai (MS). Um dos mais importantes fóruns de mulheres indígenas dos povos Guarani Kaiowá e Guarani Ñandeva, em Mato Grosso do Sul, o evento deste ano marcou os 18 anos da organização indígenas, que foram celebrados com o lançamento do documentário “Kuñangue 18 anos” e com o acolhimento da Conferência das Mulheres Indígenas 2024/2025 como parte de sua programação.
A Assembleia, que teve sua primeira edição em 2006 na Terra Indígena Ñande Ru Marangatu, acontece com o objetivo de fortalecer e evidenciar as demandas das mulheres indígenas guarani kaiowá e guarani ñandeva em Mato Grosso do Sul, criando um espaço para o acolhimento e articulação em torno das diversas pautas que tangem a vida dessas mulheres.
Além disso, é um espaço de valorização dos saberes e práticas tradicionais das guarani kaiowa, e permite que ensinamentos, cantos-rezas, cuidados e debates circulem entre diferentes gerações de mulheres, de anciãs às jovens mulheres e meninas “Mais do que encontros de mulheres, as kuñangue aty são momentos em que as mulheres se reúnem para cantar e rezar juntas, porque entre os Guarani Kaiowá, os cantos-rezas são uma das principais armas da ação política, são usados em todas as suas mobilizações por direitos”, explica Tatiane Klein, antropóloga e pesquisadora do ISA.
Em meio ao som dos instrumentos rituais mbaraka e takuapu, também acontecem discussões de pautas-chave para o movimento indígena, como a ameaça da tese do “marco temporal”; a luta das mulheres guarani kaiowá e guarani ñandeva pela demarcação das Terras Indígenas; os impactos do agrotóxico na saúde; a construção de um protocolo de consulta das mulheres sobre a adoção de crianças e adolescentes guarani kaiowá e guarani ñandeva em Mato Grosso do Sul; entre outros.
Nas discussões da assembleia, também foram temas o acesso a direitos básicos que afetam a população guarani kaiowá e guarani ñandeva como a falta de água nos territórios, e as violações de direitos humanos, como a que ocorreu na manhã de 27 de novembro. No dia em que a assembleia foi iniciada, indígenas guarani kaiowá, guarani ñandeva e terena na Reserva Indígena de Dourados (MS) sofreram uma violenta ação de repressão pela Polícia Militar de Mato Grosso do Sul que deixou cerca de 50 feridos e quatro presos.
O evento também contou com apresentações culturais, como o show da rapper Anarandá MC e a terceira edição do Prêmio Machu, que busca reconhecer e homenagear pessoas aliadas das lutas das mulheres guarani kaiowá e guarani ñandeva.
A próxima kuñangue aty acontecerá em 2025, desta vez na Terra Indígena (TI) Ñande Ru Marangatu, em Antônio João (MS).