Renomada, respeitada e querida mãe Bernadete nunca deixou de lutar pelos direitos das comunidades quilombolas e fazer resistência às ameaças constantes que recebia
Liderança quilombola de Pitanga de Palmares, em Simões Filho (BA), membro da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), ex-secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Yalorixá e liderança de terreiro são alguns dos vários títulos que mãe Bernadete carregava. Aos 72 anos, nos últimos seis buscando por justiça pelo assassinato de seu filho Binho do Quilombo, mãe Bernadete foi assassinada a tiros nesta quinta-feira (17), em sua casa, no quilombo Caipora.
“Há 6 anos atrás acontece o fato que aconteceu com o filho dela e ela sempre vinha cobrando justiça pelo que fizeram. Uma mulher forte que lutou contra todos em respeito a Binho do Quilombo”, conta Zé Ramos, liderança quilombola de São José Ramos de Freitas, Ilha de Porto do Campo (BA).
Mãe Bernadete não recebeu esse nome sem motivo. Levava consigo a força de suas ancestrais e, para além de vínculos de sangue, cuidava dos seus vários filhos.
“Falar de mãe Bernadete é o mesmo que falar de minha mãe, que falar das nossas mães ancestrais e de nossa mãe Omolu. Desde 2010 que eu conheci mãe Bernadete no encontro que teve em Seabra (BA) e daí pra cá nós construímos um laço de filho pra mãe, de mãe pra filho. É uma pessoa que tava sempre junto conosco, nos aconselhando, nos orientando no que fazer, a forma que tinha que agir. Mãe Bernadete pra nós vai estar presente sempre em nossas vidas.
Renomada, respeitada e querida mãe Bernadete nunca deixou de lutar e fazer resistência às ameaças constantes que recebia e à luta pelos direitos das comunidades quilombolas. “Ela não deixava de lutar pelo direito da comunidade, por justiça pelos filhos e principalmente pelo preconceito religioso, que era uma das coisas da temática dela que ela sempre vinha discutindo”, acrescenta Zé.
Em 2018, Mãe Bernadete gravou depoimento em campanha contra uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no STF que questionava a titulação de territórios quilombolas. Assista:
Repercussão
Nas redes sociais autoridades como a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco e o ministro dos Direitos Humanos e Cidadania, Silvio Almeida, lamentaram o assassinato de mãe Bernadete e indicaram ações para a apuração de sua morte. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também se manifestou: “O governo federal, por meio dos ministérios da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos e Cidadania, mandou representantes e aguardamos a investigação rigorosa do caso. Meus sentimentos aos familiares e amigos de Mãe Bernadete”.
Consternada com o assassinato de mãe Bernadete, yalorixá, ex Secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e líder da comunidade quilombola de Simões Filho, na Região Metropolitana de Salvador. Ela foi morta covardemente na noite desta quinta-feira com tiros no rosto. pic.twitter.com/9Uaj8kWtDn
— Anielle Franco (@aniellefranco) August 18, 2023
Recebo a informação de que Yalorixá Bernadete, defensora de dh e liderança do Quilombo Pitanga dos Palmares, foi assassinada. Determinei o imediato deslocamento das equipes do @mdhcbrasil até Simões Filho, na Bahia.
— Silvio Almeida (@silviolual) August 18, 2023
Expresso minha solidariedade aos familiares e à comunidade.
Com pesar e preocupação soube do assassinato de Mãe Bernadete, liderança quilombola assassinada a tiros em Salvador. Bernadete Pacífico foi secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial na cidade de Simões Filho e cobrava justiça pelo assassinato do seu filho, também um…
— Lula (@LulaOficial) August 18, 2023
Recebi com pesar e indignação a notícia do falecimento de Mãe Bernadete, uma amiga e grande liderança quilombola da Bahia. Determinei que as Polícias Militar e Civil desloquem-se de imediato ao local e que sejam firmes na investigação. pic.twitter.com/L1sav8co0o
— Jerônimo Rodrigues (@Jeronimoba13) August 18, 2023
A Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Rosa Weber, publicou uma nota lamentando a morte de mãe Bernadete e exigindo providências urgentes das autoridades locais para que os culpados sejam responsabilizados. “É absolutamente estarrecedor que os quilombolas, cujos antepassados lutaram com todas as forças e perderam as vidas para fugir da escravidão, ainda hoje vivam em situação de extrema vulnerabilidade em suas terras. Assim como é direito de todos os brasileiros, os quilombolas precisam viver em paz e ter seus direitos individuais respeitados."
Em nota, a Conaq repudiou o assassinato da liderança quilombola e pediu atuação do Estado para que a justiça seja feita. “Enquanto lamentamos a perda dessa corajosa liderança, também devemos nos unir em solidariedade e determinação para continuar o legado que ela deixou. Que sua memória inspire novas gerações a continuar a luta por um mundo onde todas as vozes sejam ouvidas, todas as culturas e religiões sejam respeitadas e todos os direitos sejam protegidos. A Conaq exige que o Estado brasileiro tome medidas imediatas para a proteção das lideranças do Quilombo de Pitanga de Palmares. É dever do Estado garantir que haja uma investigação célere e eficaz e que os responsáveis pelos crimes que têm vitimado as lideranças desse Quilombo sejam devidamente responsabilizados. Queremos justiça para honrar a memória de nossa liderança perdida, mas também para que possamos afirmar que, no Brasil, atos de violência contra quilombolas não serão tolerados”.
O Instituto Socioambiental (ISA) lamenta a tragédia ocorrida com mãe Bernadete Pacífico, se solidariza com seus familiares e com todos aqueles que a queriam bem. O ISA, ao lado de seus parceiros, clama por justiça. Acompanhe e cobre também por justiça com as hashtags #QuemMatouBernadetePacifico e #JustiçaPraQuilombos.