Grupo de trabalho antecede a criação do primeiro Ministério dos Povos Originários da história do país. Leia essa e outras notícias no Fique Sabendo da quinzena
Bomba da Quinzena
O Grupo de Trabalho (GT) dos Povos Originários da equipe de transição do próximo governo de Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu pela primeira vez em 21 de novembro, quando foram definidos os primeiros passos e ações do grupo. O GT está sendo considerado como um embrião do que será o primeiro Ministério dos Povos Originários da história do país, anunciado por Lula na campanha.
Entre as primeiras medidas definidas pela equipe está a elaboração de uma lista de indicação de indígenas e não indígenas para os demais 30 GTs do governo de transição, no intuito de que as pautas indígenas sejam tratadas por todas as áreas, de forma transversal.
Além disso, o GT produzirá um levantamento de todos os atos que precisam ser revogados, desengavetados e propostos, e vai solicitar informações aos órgãos públicos, como a Fundação Nacional do Índio (Funai), sobre a situação da política indigenista. O relatório final deve ser elaborado até o dia 11 de dezembro.
O documento deve demarcar as prioridades do novo ministério, como a retomada imediata das demarcações de Terras Indígenas, o fortalecimento e a recomposição orçamentária dos órgãos indigenistas e ambientais, e a retomada da fiscalização e monitoramento das terras.
Kleber Karipuna, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), foi escolhido coordenador executivo do GT. Até o momento, 15 pessoas integram o grupo, sendo 13 delas indígenas. São elas: Kerexu Guarani, Eloy Terena, Kleber Karipuna, Weibe Tapeba, Sonia Guajajara, Yssô Truká, Célia Xakriabá, Benki Piyãko, Joenia Wapichana, Davi Kopenawa, Marivelton Baré, Juliana Cardoso Terena e Tapi Yawalapiti.
Segundo a deputada federal Joênia Wapichana (REDE-RR), em relato publicado em suas redes sociais, o GT também tem discutido a mudança do nome do futuro ministério de "Povos Originários" para "Povos Indígenas". Além disso, o grupo também recolherá demandas e sugestões de organizações e lideranças indígenas.
Entretanto, o movimento indígena tem feito críticas em relação à sub-representação dos povos indígenas isolados no grupo. Beto Marubo, líder indígena do Vale do Javari – região onde foram assassinados Bruno Pereira e Dom Phillips – disse que há preocupação de que os povos isolados também sejam assistidos pelo governo federal.
Segundo Marubo, a Univaja (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari) e o Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (Opi) não foram convidados para integrar o GT. A expectativa da Univaja é trabalhar junto com a Funai no governo Lula.
“Esperamos que a Funai possa ter o seu poder de polícia regulamentado e tenha orçamento decente, voltado sobretudo para a proteção das Terras Indígenas e para desativar o esquema de destruição dos mecanismos de proteção ambiental feito durante os quatro anos de governo Bolsonaro. Esperamos que a equipe de coordenação de indígenas isolados seja totalmente renovada”, disse Marubo em entrevista ao jornal O Globo.
De acordo com Marubo, a presença de invasores e quadrilhas organizadas persiste no Vale do Javari e as ameaças contra indígenas têm se tornado cada vez mais agressivas. Recentemente, uma liderança indígena Kanamari foi ameaçada de morte sob a mira de uma arma por um pescador. Para ele, o próximo governo precisa atuar de forma contundente na proteção dos povos isolados.
Extra
A Terra Indígena Pirititi, em Roraima, está interditada por tempo indeterminado graças a um acordo judicial entre o Ministério Público Federal (MPF) e a Funai. A medida impede a circulação de não-indígenas na região com presença dos povos indígenas isolados. A Funai também informou que vai concluir os relatórios de identificação e delimitação da Terra Indígena até fevereiro de 2025.
A área vinha sendo interditada por portarias de restrição de uso desde 2012, após a Funai ter identificado pela primeira vez a existência dos indígenas isolados. Desde então, o órgão emitiu portarias de validade curta, de apenas três anos. A partir de 2021, as portarias passaram a ter validade de seis meses.
Segundo o MPF, isso criava intensas ameaças aos isolados, uma vez que invasores como grileiros e madeireiros que vivem nos limites da área tinham ciência dos prazos das portarias e ameaçavam invadir a área protegida assim que expirassem.
Com o acordo, a portaria passa a ter vigência indeterminada e a interdição só deve se encerrar quando os estudos para a demarcação forem concluídos e o território for homologado pela União.
Isso vale um mapa
Durante a COP-27, a Cúpula da ONU sobre mudanças climáticas que aconteceu no Egito, lideranças indígenas revelaram que esperam a homologação de cinco Terras Indígenas já no início do governo Lula. A homologação é o último passo para a plena demarcação do território indígena.
Em 2020, o então Ministro da Justiça, Sérgio Moro, recorreu a um parecer aprovado pelo então presidente Michel Temer para devolver à Funai 17 processos de demarcação de Terras Indígenas que estavam no órgão à espera de uma decisão do ministro. O parecer de Temer impôs a aplicação administrativa do chamado Marco Temporal.
Entre esses 17 processos devolvidos, estão cinco Terras Indígenas que aguardavam apenas o decreto de homologação.
São elas:
Terra Indígena Arara do Rio Amônia
Localizada no estado do Acre, a terra indígena foi declarada em 2009 e é lar do povo Arara.
Também está localizada no estado do Acre e foi declarada em 2007. É habitada pelos povos Katukina Pano e Yawanawá.
O território dos povos Xukuru-Kariri fica localizado em Alagoas e foi declarado em 2010.
Terra Indígena Cacique Fontoura
Localizada nos estados de Tocantins e Mato Grosso, é habitada pelos Iny Karajá. Foi declarada em 2007.
O território do povo Kaingang fica localizado em Santa Catarina, em meio aos resquícios da Mata Atlântica. A terra também foi declarada em 2007.
Socioambiental se escreve junto
Treze comunicadores de quatro comunidades da Terra Indígena Yanomami se reuniram na casa do xamã Davi Kopenawa para uma oficina cinematográfica. Juntos, cineastas e antropólogos compartilharam algumas técnicas aos comunicadores indígenas para eles mesmo contarem suas histórias da floresta com o uso de câmeras profissionais, microfones, tripés e fones de ouvido, além de manuais de edição em Yanomae e computadores para edição.
Esta é a quarta oficina de comunicação desenvolvida pela Hutukara Associação Yanomami na terra indígena, e o cinema foi escolhido como foco a pedido dos próprios indígenas. As duas primeiras ocorreram em 2018 e 2019 com ensino de fotografia e produção de boletins de áudio em Boa Vista, na sede da Hutukara. A previsão é que todos os filmes produzidos pelos comunicadores indígenas sejam disponibilizados em um canal da associação.
O protagonismo dos povos indígenas no mundo audiovisual também é tema da exposição Xingu: contatos, que abriu para visitação gratuita no IMS Paulista no início de novembro e deve acontecer até abril de 2023.
Com fotografias que narram as vivências do Parque Indígena do Xingu, a mostra estabelece diálogos entre fotografias e filmes produzidos por não indígenas desde o século XIX e o trabalho atual de cineastas, artistas e comunicadores de povos do Xingu e de outras origens.