O ISA se despede hoje de sua sócia fundadora e presidente de 2001 a 2014, Neide Esterci
Mineira de Juiz de Fora, antropóloga, Neide Esterci foi professora do Departamento de Ciências Sociais do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais e coordenadora do Núcleo de Estudos Rurais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e uma referência por suas pesquisas na Amazônia e no Nordeste brasileiros, sobre campesinato, populações tradicionais, os efeitos dos projetos de desenvolvimento associados à questão socioambiental e o trabalho escravo contemporâneo.
Neide foi sócia do Centro Ecumênico de Documentação e Informação (CEDI), sendo membro da diretoria e coordenadora do Programa Movimento Camponês do CEDI, e fez parte da fundação do Instituto Socioambiental (ISA) e da constituição do conceito de socioambientalismo.
Como lembrou Marina Kahn, do Conselho Diretor do ISA: “Neide foi nosso grande lastro para consolidar e ilustrar a visão socioambiental lançada pelo ISA. Suas pesquisas junto a populações tradicionais vinham ao encontro de nosso engajamento com sociedades indígenas. Neide tinha um jeito todo dela para colocar seus pontos de vista, indo e voltando com opiniões expressas com delicadeza e doçura inigualáveis, até as ideias ficarem azeitadas e pacificadas.”
Foi uma pessoa-chave na formação desse campo, tanto na sociedade civil, quanto como pioneira do que viria a se constituir uma nova área de pesquisa nas Ciências Sociais.
Para Deborah Lima, ex-presidente do ISA, Neide Esterci deixa um legado profundo e transformador na Antropologia brasileira, especialmente voltado para a Amazônia. “Dedicou-se ao estudo pioneiro sobre peões e posseiros na região do Araguaia e se aprofundou no tema da escravidão contemporânea e das relações de trabalho no campo, abordando questões de exploração e dominação que persistem até os dias atuais. Seu trabalho é um marco de resistência e denúncia, que continua inspirando novas gerações a lutar por justiça social e dignidade no meio rural.”
Os seus estudos dedicados aos conflitos socioambientais e à relação entre sociedade e natureza estão presentes em seus artigos, livros organizados e no trabalho editorial no Boletim Rede Amazônia, assim como na criação de grupos de trabalho na Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (ANPOCS) e na Sociedade Brasileira de Sociologia (SBS).
Uniu o rigor acadêmico com o compromisso e o engajamento políticos contra as distintas formas de injustiça social e ambiental.
Anthony (Tony) Gross, também fundador do ISA, disse sobre ela: “Neide foi uma daquelas pessoas raras na vida da gente: uma colega e amiga doce, ponderada, generosa e firme nas suas convicções. Uma pesquisadora talentosa, uma orientadora querida e, para todos nós, uma fonte de ternura e bons conselhos. Durante quatro décadas ou mais, foi um dos esteios do CEDI, primeiro, e depois do ISA. No ISA, como presidente do Conselho Diretor, sua contribuição ao nascimento e consolidação da nova instituição foram inestimáveis.”
Seu legado vem sendo reconhecido e discutido em eventos recentes, como o Projeto Trajetórias, a Bionota da SBS e o Seminário ‘A contribuição de Neide Esterci para os estudos rurais e ambientais no Brasil’ realizado no IFCS/UFRJ em 2016.
Neide deixa viúvo o sociólogo José Ricardo Ramalho, com quem teve dois filhos: Thomaz Ramalho, advogado, e Emiliano Ramalho, biólogo, diretor técnico-científico do Instituto Mamirauá; além do neto Pedro, cantor e compositor.
Entre seus livros, deixa Territórios socioambientais em construção na Amazônia brasileira (2018), Militância Política e Assessoria: compromisso com as classes populares e resistência à ditadura (2017), Reforma Agrária e Meio Ambiente (2003), Fazendo Antropologia no Brasil (2001), Escravos da Desigualdade: um estudo sobre o uso repressivo da força de trabalho hoje (1994) e Conflito no Araguaia: peões e posseiros contra a grande empresa (1987).
Seu velório será realizado nesta terça-feira (19/11), entre 11h e 14h, no Crematório do Cemitério Vertical Memorial do Carmo, sala 7, Caju, Rio de Janeiro - RJ.
"Neide, querida, recebe nosso amor e agradecimento por tanto conhecimento produzido e compartilhado, pela doçura incansável e inspiradora. Vc fica em nós." Ana Valeria Araujo
“Voa leve, Neide querida. Semeaste amor, deixaste um rastro de ternura e uma saudade que não se apaga.” Deborah Lima
“Querida Neide, sentiremos tua falta. Somos órfãos e agora a vida terrestre fica um pouco mais chata.” Tony Gross
“Só temos a agradecer por tanto que Neide contribuiu com o socioambientalismo no Brasil e com o ISA em particular, com seu jeito firme e doce de dizer as coisas importantes e ensinar muito a todos nós.” Adriana Ramos