Medidas incluem programa de sociobiodiversidade e R$ 825 milhões para Ibama. Lula defende Marina Silva e muda discurso sobre órgão ambiental

Com informações da assessoria do Ministério do Meio Ambiente (MMA)
O governo federal anunciou, na terça (3), um pacote de medidas para marcar o Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado nesta quinta (5). As ações foram antecipadas para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pudesse formalizá-las pouco antes de embarcar para a viagem de uma semana à França.
As iniciativas incluem R$ 825 milhões do Fundo Amazônia para apoiar a fiscalização ambiental e o combate ao desmatamento na Amazônia. Também foram lançadas ou ampliadas políticas específicas de proteção da biodiversidade.
Lula assinou os decretos de criação de três novas Unidades de Conservação (UCs) e de formalização dos limites de outra. Na segunda (2), também foi publicada a portaria que reconhece os limites do quilombo de Pedro Cubas de Cima, em Eldorado (SP). No total, o conjunto de áreas protegidas do pacote soma mais de 80 mil hectares, o equivalente a cerca de metade do município de São Paulo.
Ainda na segunda, saiu a portaria do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) que cria o Programa Nacional de Fortalecimento da Sociobiodiversidade (Pró-Sociobio) (saiba mais abaixo e no quadro ao final da reportagem).
“Não tenho dúvida nenhuma de que poucos países do mundo têm trabalhado de forma incansável para atingir não a meta que alguém nos impôs, mas a meta que nós nos impusemos. Porque somos um governo que acredita que existe uma crise climática de verdade, que não é fantasia de academia”, disse Lula.
O Brasil apresentou uma meta de corte de emissões de gases de efeito estufa no tratado internacional sobre mudanças climáticas que prevê, entre outros pontos, zerar o desmatamento da Amazônia até 2030.
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, ressaltou a queda do índice de destruição da floresta de cerca de 46%, entre 2022 e 2024, e voltou a cobrar ações dos países desenvolvidos para o combate ao desmatamento e às mudanças climáticas.

“Isso não é mágica, não acontece da noite para o dia, é preciso um esforço dos 196 países signatários da Convenção do Clima da ONU. Os ricos terão que liderar esse esforço e os países em desenvolvimento virão em seguida. O Sul Global deve dar sua contribuição, e está dando, mas o mundo desenvolvido também, acelerando a redução de CO2 e fornecendo os recursos necessários para a implementação”, disse.
“Esse dia mundial do meio ambiente é de poucas comemorações, visto que a agenda ambiental é alvo mais de retrocessos do que de avanços significativos. Mas diante de tantos ataques, celebramos as boas notícias, como a criação das novas áreas protegidas”, avalia a secretária-executiva do Instituto Socioambiental (ISA), Adriana Ramos.
Lula também sancionou a lei que amplia de 20% para 30% o percentual de cotas para pessoas negras em concursos públicos do governo federal. O texto prevê que o novo percentual também valerá para indígenas e quilombolas, seguindo modelo semelhante ao das universidades federais. O texto da legislação prevê as cotas em concursos de órgãos da administração pública direta, autarquias e fundações públicas.
Marina e Ibama
A cerimônia no Palácio do Planalto acabou reverberando as ofensas recebidas no Senado por Marina dos senadores Plínio Valério (PSDB-AM) e Marcos Rogério (PL-RO) na semana passada.
Os ataques à ministra acabaram sendo alvo de protestos ocorridos no domingo (1), convocados contra o projeto de lei sobre licenciamento ambiental que está hoje na Câmara. Marina recebeu muitos apoios na imprensa e nas redes sociais e acabou saindo politicamente fortalecida.
Lula defendeu a ministra. “A Marina Silva é uma companheira da mais extraordinária lealdade ao governo. É uma companheira que eu tenho 100% de confiança”, afirmou.
Ele amenizou o discurso sobre o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) depois de pressionar publicamente Marina e o órgão pela autorização para uma das etapas do processo de exploração de petróleo na Foz do Rio Amazonas, no Amapá ‒ a medida acabou saindo no dia 19. O presidente havia dito que a instituição estava de "lenga lenga" e parecia agir "contra o governo" por não liberar logo a licença para o empreendimento da Petrobrás.
A mudança de postura vem depois do barulho feito nas redes sociais e nas ruas contra a proposta que desmonta o sistema de licenciamento ambiental no país, e em defesa de Marina.
“A morosidade do Ibama não é nem má fé. É a falta de especialistas”, disse Lula. Ele informou que, quando tomou posse em 2023, o Ibama tinha 700 servidores a menos do que em 2010, quando terminou seu segundo mandato.

Pró-sociobio
Já há algum tempo havia a expectativa da criação de uma política ou iniciativa oficial de estímulo aos produtos da sociobiodiversidade. A criação do Pró-sociobio é considerada um avanço, portanto.
A sociobiodiversidade engloba os produtos das florestas e de outros biomas obtidos por meio dos conhecimentos e práticas sobre o uso e conservação da diversidade biológica desenvolvidos por pequenos agricultores, camponeses, indígenas, quilombolas e outras comunidades tradicionais.
O assessor do ISA para o tema João Luis Saraiva Moraes Abreu explica que a portaria do MDA que crou o Pró-sociobio prevê o uso do Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) e de recursos obtidos por projetos de conservação ambiental para a implementação do programa.
“Essa diretriz converge com as propostas que temos formulado, ao defender que o PSA e os recursos oriundos da redução de emissões e da conservação florestal sejam utilizados como instrumentos de fomento às economias da sociobiodiversidade”, avalia.
Abreu defende que, agora, é necessário avançar em políticas sobre o assunto, por exemplo, com a incorporação do PSA na Política de Garantia de Preços Mínimos para Produtos da Sociobiodiversidade (PGPMBio), o desenvolvimento de políticas de crédito, programas de aquisição de alimentos que valorizem o manejo da biodiversidade e seguros que apoiem comunidades tradicionais diante de perdas de safra causadas por eventos climáticos extremos — como ocorreu com a castanha neste ano no Norte do país por causa da seca.
“Esses passos são necessários para o reconhecimento prático do papel estratégico dessas populações e de suas economias na gestão territorial e ambiental de vastos territórios preservados, fundamentais para a regulação climática e para a estabilidade da economia nacional e global”, pontua.

Medidas do pacote federal do Dia do Meio Ambiente
R$ 825 milhões do Fundo Amazônia para o Ibama. Os recursos são para compra de helicópteros e drones e a construção de bases aéreas e helipontos. Também estão previstos a instalação de centro de treinamento, bases móveis de fiscalização, depósitos para bens apreendidos e novos sistemas digitais para monitoramento ambiental e aplicação de sanções. A iniciativa contempla ainda o uso de inteligência artificial para autuação remota de crimes ambientais e o fortalecimento da gestão institucional do órgão.
Área de Proteção Ambiental (APA) da Foz do Rio Doce (ES). Com 45,4 mil hectares, está nos municípios de Linhares e Aracruz, e integra áreas terrestres e marinhas da Mata Atlântica. A área foi criada como parte do acordo judicial para reparar os danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), ocorrido em 2015. A APA é a Unidade de Conservação (UC) com menor nível de proteção ambiental, permitindo em seu interior uma série de atividades econômicas.
Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS). Foram criadas as RDS do Faxinal São Roquinho, com 1,2 mil hectares, e Bom Retiro, com 1,5 mil hectares, ambas em Pinhão (PR). O objetivo é preservar os remanescentes de florestas de araucárias e assegurar as condições de vida dos faxinalenses. Os faxinais são áreas onde as comunidades tradicionais criam animais soltos em terras coletivas, principalmente porcos, que constituem importante fonte de renda e alimentação.
Definição dos limites do Parque Nacional Saint-Hilaire/Lange (PR). Também foi assinado o decreto que estabelece os limites da área, localizada na Serra do Mar, no Paraná. Com 25,1 mil hectares, a UC foi criada em 2001, mas sem limites definidos.
Programa Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa). Também oficializada por meio de decreto, a ampliação do Arpa permitirá o apoio direto às comunidades localizadas em 60 UCs de uso sustentável.
Quilombo de Pedro Cubas (SP). A portaria do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) reconhece oficialmente e declara os limites da área, localizada em Eldorado, no Vale do Ribeira, sudeste de São Paulo. A medida beneficia 35 famílias quilombolas, mas ainda não conclui a regularização da área: ficam faltando as etapas de desapropriação e titulação.
Programa Nacional de Fortalecimento da Sociobiodiversidade (Pró-Sociobio). O objetivo é promover o desenvolvimento territorial sustentável e a conservação dos biomas brasileiros, a partir da estruturação das cadeias produtivas da sociobiodiversidade, para ampliação da capacidade de produção de alimentos saudáveis. Prevê o uso do Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) e de recursos obtidos por iniciativas de conservação ambiental para a implementação do programa.
Estratégia e Plano de Ação Nacionais para a Biodiversidade (Epanb). Diretriz para a implementação de metas e ações de conservação da biodiversidade, uso sustentável dos recursos naturais e repartição justa dos benefícios derivados da diversidade biológica para todo o país, com integração de diferentes setores do governo e da sociedade.
Estratégia Nacional para a Conservação e o Uso Sustentável dos Recifes de Coral (Pró-Coral). Tem por finalidade implementar, orientar, articular e coordenar políticas públicas integradas para a conservação, uso sustentável e recuperação dos recifes de coral e de outros ambientes recifais.
Nova Lei de Cotas no Concurso Público Federal. Amplia de 20% para 30% o percentual de cotas para pessoas negras em concursos públicos do governo federal. O texto prevê que o percentual para cotas também valerá para indígenas e quilombolas, seguindo modelo semelhante ao adotado nas universidades federais. O texto aprovado pelo Congresso prevê as cotas em concursos em autarquias, fundações públicas, empresas públicas ou sociedades de economia mista.